A dor e o sofrimento no contexto da parábola do bom Samaritano (Lc 10, 25-37)

1. Introdução

O homem interroga-se, frequentemente, se o sofrimento e a dor são inerentes à existência humana. São acontecimentos naturais e inevitáveis. Recusá-los como um mal a ser vencido a qualquer preço é um paradigma da sociedade em que vivemos. A racionalização desse mal pode ser traduzida no sentimento generalizado de recusa ou de fuga a qualquer tipo de dor, física ou moral. Assim, a pessoa perante a dor interroga-se: Sofrimento? Porquê? Para quê? Mas o sofrimento faz parte da vida de todos os Homens. Nascemos “na dor” e morremos “na dor”, conforme referia Santo Agostinho “Vir ao mundo em corpo mortal é começar a sofrer”.1

O profissional de saúde, no dia a dia, encontra vários motivos que o fazem reflectir sobre a dor, onde encontra, frequentemente, motivos que o levam a aproximar-se do sofrimento. O sofrimento tem sentido na sociedade actual?

Nas instituições de saúde, a dor e o sofrimento convivem muito de perto. No dia a dia, os profissionais de saúde recebem grandes lições relacionadas com as atitudes frente à dor e ao sofrimento. Estas experiências induzem sensações que podem oscilar entre o doloroso e o agradável, o mau e o bom, surgindo, assim, sucessivas interrogações sobre a origem da dor, do sofrimento, mas esta problemática acentua-se em contexto hospitalar, daí a escolha do tema — A Dor e o Sofrimento em Contexto Hospitalar: Para uma Compreensão do Papel do Profissional de Saúde. A humanização, em saúde, tem um véu como o de Verónica, segundo a narrativa apócrifa, no qual estão estampados a dor e o sofrimento dos doentes, tal como encontramos no Desvalido pela via crucis. Quando se levanta o véu que cobre o Rosto do doente, neste desvelamento surge a nudez onde o Outro (desvalido) se revela como epifania do sofrimento e da dor. O véu que cobre o Rosto esconde o sofrimento, como porta de entrada na humanização. O desvelamento da dor e do sofrimento marca a nudez do Outro e faz o “compromisso esplancnofânico” do Samaritano. Pela carta apostólica Salvifici Doloris, João Paulo II diz-nos que Boni Samaritani parabola ad doloris evangelium pertinet, no sentido de que nos “aproxima” da dor e do sofrimento. Assim, se proporá que Boni Samaritani parabola in doloris evangelium. Revela-se, pois, na narrativa exemplar, uma “boa notícia soteriológica”, dado que a parábola está dentro do sofrimento de Cristo e de todos os desvalidos (doentes, nus, famintos, etc.). Pelo facto de esta narrativa, exclusiva de S. Lucas, estar integrada na última viagem de Cristo para Jerusalém (Lc 9, 51 ss.), até poder ser propedêutica das narrativas da Paixão e Morte de Cristo, a parábola do Bom Samaritano significa o páthos de Deus-Pai, na crucifixão, do Servo sofredor pelo seu grito de dor. A humanização tem um evangelho, que está no sofrimento e o seu ícone representa-se no Bom Samaritano. O homem das dores, o vos omnes, é o ánthropós tis que, no pretório, assume a condição do sofrimento. O Desvalido pelo Caminho da dor e do sofrimento é o lógos sárx egéneto que será o lógos do sofrimento de Deus. Encontramos, no Servo de YHWH, o “homem das dores” que vivencia tudo quanto a narrativa do sofrimento prefigura e mostra a teodramática de um Deus que está no Gólgota.

O Presente Trabalho constitui o ponto de partida para uma reflexão científica da dor e do sofrimento. Estruturar-se-á, na primeira parte, sobre algumas definições de dor e de sofrimento, seguindo-se uma análise filosófica, segundo E. Levinas, e teológica das mesmas. Na segunda parte, apresentar-se-á uma abordagem da dor e do sofrimento, em contexto hospitalar, e as atitudes a adoptar perante a dor e o sofrimento, a fim de os minimizar e, quem sabe, eliminá-los do doente.

2. Para compreender a dor e o sofrimento

Desde sempre o homem se preocupou com o problema do sofrimento. Muitas vezes questionamo-nos, porque sofremos? Porque existe o sofrimento?

A experiência da dor pode ser tão antiga como a espécie humana, contudo continuamos perante um desafio — o seu estudo. Segundo relatos descritos, já os antigos Egípcios, 4. 000 a. c., e os antigos chineses há cerca de 2. 000 anos tinham tratamentos para a dor. Platão e Aristóteles colocaram a dor como paixão da alma; Hipócrates e Galeno também se preocuparam com a dor e admitiram a relação entre o corpo e a mente. No cristianismo a dor era vista como punição, provação, portanto, a definição da dor evoluiu até à perspectiva actual.2 Constatamos, assim, que a dor não é unívoca e foi, desde sempre, companheira do homem.

Todos temos consciência que a dor e a memória da dor mudam o nosso comportamento em numerosas situações. Dor e sofrimento são difíceis de definir pelos médicos; dor moral é diferente de dor física, esta última é transmitida por arcos e trajectos neurais. A dor é subjectiva só podendo ser conhecida pelo próprio variando de intensidade. “O sofrimento parece algo quase inefável e não comunicável”.3

O homem sofre de diferentes maneiras, pois “o campo do sofrimento humano é muito mais vasto, muito mais diversificado e mais multi-dimensional”.4 O sofrimento é uma área mais vasta e difícil que a doença e, simultaneamente, mais enraizado na própria humanidade. Isto traduz a distinção entre sofrimento físico e moral, distinção que toma como fundamento a dupla dimensão do ser humano e indica o elemento corporal e espiritual como imediato ou directo sujeito do sofrimento.5 No entanto, “não se pode negar, efectivamente, que os sofrimentos morais têm uma componente «física» ou somática e que, frequentemente, se reflectem no estado geral do organismo”.6 Podemos afirmar que o homem sofre quando experimenta algum mal. Assim, a realidade do sofrimento levanta uma questão quanto à essência do mal: o que é o mal?

Na perspectiva do Papa João Paulo II, o mundo do sofrimento goza como que a sua própria solidariedade. Os que sofrem tornam-se idênticos entre si devido à semelhança da sua situação, à provação do destino compartilhado, à necessidade de compreensão e de cuidados, sobretudo por causa do contínuo questionar-se sobre o sentido do sofrimento.7

Na perspectiva psicológica, os conceitos de dor e de sofrimento são sinónimos. “A definição de dor, «sofrimento físico ou moral; mágoa, aflição», sobrepõe-se à de sofrimento — «acto ou efeito de sofrer; suportar, tolerar; padecer dores físicas ou morais, sentir dores físicas ou morais; padecer com paciência» ”.8 No domínio da psicologia a dor, para além de ser subjectiva, é uma experiência desprezível. A dor física influencia, reciprocamente, a dor psicológica.

No entanto, o julgamento humano frente ao sofrimento parece que está viciado de premissa falsa, se alguém sofre é porque o merece, bem como se tem felicidade é porque fez ou lutou por isso.

A dor e o sofrimento humanos são atributos do ser humano já que eles “pressupõem, não só uma componente neurológica, mas também a memorização e o repercutir psicológico que lhe dão uma clara implicação em comportamentos futuros”.9 Portanto, o homem constrói-se com e pelo sofrimento.

3. Definição de dor e de sofrimento

Qualquer distinção de dor e de sofrimento é “algo artificial”,10 pois quer nos dicionários quer em linguagem comum estes dois conceitos remetem um para o outro.

O sofrimento humano recuperou o seu significado central na experiência de “sentir-se doente”, assim como a sua complexidade como fenómeno que afecta a pessoa no seu todo. Isto porque o conceito de saúde como sinónimo de ausência de doença tem vindo, sucessivamente, a ser substituído pelos conceitos de bem-estar e de qualidade de vida.

A palavra “dor” tem origem no latim dolore. A dor é “uma experiência subjectiva, difícil de definir e muitas vezes também de descrever ou interpretar”.11 É o “desconforto severo que ameaça a integridade e continuidade da minha pessoa enquanto um todo”.12 O sofrimento “é uma experiência inevitável do ser humano «consciente de si» e confrontado com a sua condição de vulnerabilidade e finitude”.13

Por vezes, as palavras «sofrimento» e «dor» são usadas como sinónimos, no entanto o sofrimento físico verifica-se quando, seja de que modo for, «dói» o corpo, enquanto o sofrimento moral é «dor da alma». Trata-se, de facto, da dor de tipo espiritual e não apenas da dimensão «psíquica» da dor, que anda sempre junta, tanto com o sofrimento moral, como com o sofrimento físico.14

Empiricamente, podemos afirmar que a dor é uma “sensação física” e o sofrimento uma “sensação psíquica”. Naturalmente que uma dor intensa e indesejável provoca sofrimento e como afirma Vasco Magalhães “usamos mais a palavra «dor» para falar do mal físico e «sofrimento» aplica-se mais à «dor moral» ”.15

A dor é um sintoma que acompanha, de forma transversal, a maioria das situações patológicas que requerem cuidados de saúde, sendo o sofrimento mais comum o sofrimento da doença. No entanto, o sofrimento é importante para orientar a ajuda médica. Este tipo de dor deve ser sempre aliviada com base na opinião dos especialistas do tratamento da dor e podemos afirmar que no actual momento não há dor “intratável”.

Um outro tipo de sofrimento inútil é o sofrimento que está fora da sua função biológica, designadamente, o castigo aos escravos. Mas ainda há um outro sofrimento, o sofrimento sem dor, este tipo de dor que levanta questões de difícil solução. Este sofrimento resulta da criação da inteligência reflexiva do homem. “Um sofrimento espiritual, psico-afectivo”.16

À luz do pensamento de Cícero, a dor física atribui-se ao corpo, porquanto a dor moral atribui-se à doença da alma. Para ele o corpo não percebe a doença da alma. Esta perspectiva está por detrás da atitude actual.17

A descrição e distinção da dor e do sofrimento também são abordadas por L. Lavelle. Para o autor, a dor é como um “rasgão” interior muito forte. A dor física relaciona-se com lesão do corpo, não absorve as forças da consciência, enquanto a dor moral/sofrimento preenche toda a capacidade da nossa alma. Neste contexto a dor como está ligada ao corpo está, também, ligada ao momento, ao instante, ou seja, há momentos em que está apagada e em que ela reanima. Por outro lado, o sofrimento está sempre ligado ao tempo. O sofrimento é uma “queimadura” de um invisível “fogo interior”. Para este autor a dor só interessa a uma parte de mim mesmo, nesta, o que está em primeiro lugar é a característica do corpo. Mas, no sofrimento, o “eu” está totalmente envolvido e é um processo mais complexo porque sofremos nas relações que estabelecemos com os que nos rodeiam. “Experimento a dor com o meu corpo, mas sofro com todo o meu ser… ”.18

Na óptica do psiquiatra Marc Schwob, especialista da dor, o sofrimento é sentido, verbalizado de maneira diferente por cada homem, segundo as suas origens, culturas, religiosas e étnicas.19 Afirma que “a palavra «dor» tem, […], uma definição dupla: é uma sensação única, particular, individual, intransmissível, intraduzível, sempre […] reconhecida como tal por quem a sente; é também o conjunto de todos os fenómenos físicos, psicológicos ou morais sentidos como «desagradáveis», «dolorosas», «angustiantes» ”.20

Perante destas reflexões, o conceito de dor sofreu várias alterações ao longo dos tempos. Actualmente está definida com relativa precisão, o que facilitou a descoberta de tratamentos. No entanto, é difícil definir os limites entre a dor e o sofrimento, entre a sensação e a emoção. Para compreender a dor é fundamental compreender o homem na sua dor, que a sofre de forma diferente de acordo com a sua origem, raça, cultura e personalidade. A linguagem da dor deve ser compreendida porque esta transforma-se num estado emocional: o sofrimento.

O fenómeno de dor é descrito por Jeremias, no Livro das Lamentações, como um estado de aflição moral, pois a aflição, desgosto, desespero, desgraça, angústia são os termos de descrição frequentemente encontrados na Bíblia. A cultura Judaico-cristã concebe a dor dessa forma, mas com os anatomistas, os biologistas, cientistas, a dor passa a constituir-se como um fenómeno puramente físico.

Constatamos que existe uma grande variabilidade na percepção e expressão da dor, face a uma mesma estimulação dolorosa. A resposta à dor é estritamente individual. Há estudos nesta área que demonstram diferença por exemplo no sexo, na actividade profissional.21

Hoje em dia é essencial, para além de aliviar o sofrimento, compreender a origem e os seus mecanismos, por isso a diversidade das expressões de dor é de difícil compreensão. Empiricamente, pensamos que a dor expressa reflecte a dor sentida.22 A amplitude do “sofrimento moral e a multiplicidade das suas formas não são menores do que as do sofrimento físico; mas o primeiro apresenta-se como algo mais difícil de identificar e de ser atingido pela terapia”.23

A pessoa com dor manifesta determinado comportamento e é este comportamento que traduz uma mensagem. A maneira como a dita mensagem da dor é percebida pelo profissional de saúde e a forma como o profissional de saúde diz ao doente e a interpreta, tem um papel importante na relação do enfermeiro com o doente.24

A definição mais actual, no campo da saúde, é: A Direcção Geral de Saúde, na Circular Normativa nº 9 de 14/06/03 (Anexo I), define a dor como “uma experiência multi-dimensional desagradável, que envolve não só a componente sensorial como uma componente emocional da pessoa que sofre”.25 A Direcção-Geral da Saúde, na referida circular, instituiu a “Dor como o 5º sinal vital”.

Atendendo a que:

  1. A dor é um sintoma que acompanha, de forma transversal, a generalidade das situações patológicas que requerem cuidados de saúde.
  2. O controlo eficaz da dor é um dever dos profissionais de saúde, um direito dos doentes que dela padecem e um passo fundamental para a efectiva humanização das unidades de Saúde.26

Esta abordagem da dor e sua divulgação vêm demonstrar a importância que, actualmente, se está a atribuir à dor.

4. O sofrimento como sentido de vida

Na base do sofrimento experimentado pelo homem e, ainda, na base de todo o mundo dos sofrimentos aparece, inevitavelmente, a pergunta: porquê? Esta pergunta encontrou o seu enunciado mais vivo no Livro de Job.27 O homem busca a resposta sobre o sentido do sofrimento. Esta busca deve começar por nós, pois a nossa atitude perante o sofrimento é que pode causar, ou não, mais sofrimento no outro e podemos ou não tornarmo-nos “melhores” ou “piores”.

O livro de Job dá-nos um ensinamento para a vida. Job fez do seu sofrimento a sua vida. Neste livro, a contestação da sabedoria faz-se através da incompreensibilidade dramática do sofrimento humano.28 Job é conhecido como um homem justo, inocente, que é provado com excessivos sofrimentos. Job faz fortes lamentações sobre a sua sorte. Não se vira contra Deus, mas contra a sua própria existência, o seu nascimento, a sua vida. “Porque não morri ao deixar o ventre materno” Job (3, 11). Portanto, assim “o sofrimento tem carácter de prova”.29 Em analogia, no contexto hospitalar, Job pode significar todos os doentes que sendo, muitas vezes, inocentes não compreendem o porquê do seu sofrimento.

Viktor Frankl realçou que a dor e o sofrimento, de uma forma geral, são essenciais ao crescimento humano. Este autor parte da vivência do seu próprio sofrimento para a teorização terapêutica, desenvolvendo a Logoterapia, a terapia que se ocupa da busca do sentido. Para o autor há necessidade de que todos os homens possuam um sentido de vida, sendo esse sentido de vida que os faz prosseguir e ser livres perante a fatalidade do destino. O homem necessita de ter um sentido de vida para, assim, ultrapassar a sua dor e o seu sofrimento. Segundo o autor, devemos responder (assumindo o sofrimento) e não perguntar.30 O importante para o homem é encontrar um sentido para a vida, naquela conjuntura, naquela situação, um sentido concreto, um supra-sentido, um sentido último da vida. O homem deve transcender às situações difíceis, nunca devemos desistir da pessoa, temos é de ajudar a pessoa a recuperar.31

Viktor E. Frankl dedicou a sua longa vida reflectindo sobre o sentido da vida e a de ajudar os que tinham perdido este sentido a reencontrá-lo. Ele estava convencido do papel central do sentido da vida na existência de cada ser humano e das consequências catastróficas para o indivíduo, da perda deste sentido que criou uma nova e eficaz metodologia psicoterapêutica, a que denominou “Logoterapia”.

Mesmo nos campos de concentração, Viktor Frankl viu que a chave para sobreviver estava baseada na capacidade, nas circunstâncias de encontrar um sentido para a própria vida: A resposta típica que leva alguém a rejeitar todos os argumentos encorajadores é: “Não tenho nada a esperar da vida, nunca mais. Que dizer-lhe? ”Aquele que não via na sua vida nenhum sentido, objectivo ou propósito, nenhum ponto para continuar, a breve trecho estava perdido“.32 Viktor Frankl verificou que as pessoas que têm de lutar pela vida todos os dias, raramente, perdem o interesse por ela. A sua prática terapêutica criou-lhe a convicção de que a perda do sentido da vida é uma fonte de profundo sofrimento, causado por um estado que chamou ”vazio existencial".33

No espírito de Viktor Frankl “o homem está sempre orientado para outra coisa que não ele próprio; quer seja um sentido que procura realizar, quer outro ser humano com o qual quer encontrar-se. […], o facto de ser homem sempre o projecta para além de si próprio; e esta transcendência constitui a própria essência da existência humana34”. Na mesma linha de pensamento, o sentido não pode ser dado, tem de ser encontrado. O sentido é uma coisa para descobrir, não para criar. Também reconhece que a consciência que nos torna capazes de encontrar um sentido para a vida, sendo humana, é marcada pela finitude e pode enganar o homem. Na verdade, mesmo no fim da vida, não podemos saber se encontramos o verdadeiro significado da vida. Mas esta incerteza não deve fazer-nos evitar o risco da busca.

5. O sofrimento na perspectiva de E. Levinas

A dimensão ética, na área da saúde, envolve tanto o respeito por nós mesmos, enquanto pessoas, como o respeito pelos outros — os doentes. O respeito por nós começa quando nos tratamos com gentileza e com dignidade para podermos olhar os outros com a mesma gentileza e dignidade.

O cumprimento da conduta ética, segundo E. Levinas, parte do assumirmo-nos responsáveis pelo sofrimento do outro até ao fim, esta responsabilidade não tem fim. O autor afirma, ainda, que o nosso sofrimento não é igual ao sofrimento do outro. Cada um tem uma forma de sofrer única e intransmissível. Infelizmente, o sofrimento é intangível. O sentido do sofrimento do outro leva-nos a perspectivar que o sofrimento no outro é para nós imperdoável, porque nos solicita, nos chama e, assim, a nossa própria aventura de sofrimento, cuja inutilidade aqui toma sentido, no sofrimento injustificável do outro, abre a perspectiva ética do inter-humano, levando a abertura original do “cuidador” que se vem impor na categoria antropológica da atenção e da acção aos outros que nos apelam Eu/Tu, também abordado por Martin Butter.

Levinas entende a responsabilidade como “responsabilidade pelo outrem, portanto, como responsabilidade por aquilo que não fui eu que fiz, ou não me diz respeito”.35 Na óptica de Levinas, desde que o outro me olha, sou por ele responsável, sendo assim “a sua responsabilidade incumbe-me”36 e, como ser humano, não posso negar. Esta imposição “é uma suprema dignidade do único”.37

Levinas também abordou o tema da morte referindo: “penso que na responsabilidade por outrem se é, em última análise, responsável pela morte do outro”.38 A ordem, em Levinas, é não deixar o outro sozinho, no momento da sua morte: morrer no corredor da morte ou aguardar a morte no corredor. Isto constitui com toda a certeza o fundamento da solidariedade.

Para Levinas, o outro é a nossa responsabilidade, por isso é preciso“tomar” o seu sofrer. Não se pode responder ao sofrimento do outro, sem se expor, desnudar-se, mostrando a essência humana do nosso ser. Portanto, o Outro é aquele que permanece inseparável da ideia de infinito.39 O Outro é aquele para o qual somos eleitos, através do infinito. O outro pode então ser o meu amigo, um doente, um desconhecido. O outro é “o homem da rua, o homem da estrada, quem passa, o primeiro que chega”.40 O Outro é, para mim, aquele com o qual me encontro face-face.

Todo este questionamento de si é, exactamente, o “acolher o Outro. A manifestação do absolutamente outro é rosto onde o Outro me interpela e significa uma ordem pela sua nudez, pela sua privação”.41 Levinas afirma que “o acesso ao rosto é, num primeiro momento, ético”.42 E sublinha que “a melhor maneira de encontrar outrem é nem sequer atentar na cor dos olhos! ”.43 Porque o que é especificamente rosto é o que não se reduz a ele, é o que ele nos pode traduzir, vai para além do físico, é o infinito.44

É a exigência ética do rosto que põe em questão a consciência que o acolhe. Digamos que, a epifania ética do rosto consiste em solicitar uma resposta.45 Portanto, tendo por base o pensamento de Levinas, precisamos de ter um plano de actuação na prática que transcenda a epifania do rosto do outro.46

A importância do rosto é analisada por Etelvina Nunes onde afirma que “é no rosto que a pessoa se exprime e manifesta duma maneira peculiar”. Mas, para além do rosto há um olhar. Etelvina afirma ainda, que é “pelo olhar a outra pessoa exprime-se em toda a sua dimensão, para além de qualquer contexto” .47 O olhar do «Outro» leva-nos a reconhecer a sua dignidade, porque o Outro está dependente; por isso ele é, à primeira vista, o nosso semelhante, e a relação só se instaura se eu reconheço a sua dignidade de outro, se eu acolho o seu apelo. Perante o apelo do rosto pelo seu olhar, nós somos convidados para o ajudar, não só a ele mas também aqueles em nome dos quais ele me interpela, não tendo direito à palavra, me interpelam no seu rosto.48 Isto é vivenciado nas Unidades de Saúde onde o doente, às vezes, está incapacitado para falar mas, transmite “tudo” com o seu rosto, principalmente, com o seu olhar.

Na óptica de Levinas, “o rosto é a parte mais expressiva do outro. É no rosto que o outro se manifesta como verdadeiramente outro […]”.49 O outro faz-nos descobrir a nossa identidade, porque nos descobrimos na resposta que vem do seu apelo, descobrimo-nos como responsáveis por ele. O rosto impõe-se-nos sem abandonarmos a responsabilidade pela sua situação, e é a presença do outro que significa para nós uma ordem, um mandamento, que questiona todo o movimento ético da nossa vida pessoal e profissional: a nossa liberdade e o meu egoísmo.50

Podemos afirmar que “a relação inter-humana é revelada pelo rosto. O rosto é mediador da análise da significação como começo da inteligibilidade”.51 Portanto, “a expressão que o rosto introduz no mundo não desafia a fraqueza dos meus poderes, mas o meu poder de poder”.52

Digamos que “a epifania do rosto como rosto abre a humanidade”.53 Na perspectiva de Etelvina Nunes, o ser pessoa pressupõe os outros, o nosso doarmos a eles, mas também nos faz descobrir com uma identidade a sua unicidade sempre mais assumida e capaz de resistir às mudanças.54

Aos olhos de E. Levinas, cumprimos a nossa função ética, ao assumirmo-nos, até ao fim, responsáveis pelo sofrimento do Outro. Basta um estender a mão, isto porque “a apresentação do rosto põe-me em relação com o ser”,55 em analogia ao contexto hospitalar com o doente.

Aceitar a inutilidade do sofrimento que predominava até ao século XX seria aceitar o mal. A nossa luta cruza-se com o encontrar um novo sentido para o sofrimento, perspectivando a relação do Eu com o Tu, ou seja, a ordem inter-humana, que consiste na não insensibilidade e na responsabilidade que Levinas fala de uns para os outros. Como afirma Levinas, “o outro é da minha responsabilidade”, por isso é necessário “tomar” o seu sofrer. Não se pode responder ao sofrimento do outro sem se expor, desnudar-se, demonstrando a essência humana do nosso ser.56 Segundo Levinas, o homem deve estar à escuta da “presença” do outro, em analogia com a área da saúde, do doente para estabelecer novos laços, numa reciprocidade fundada, unicamente, na responsabilidade pelo Outro.

Apesar do mal ser incompreensível, injustificável, o sofrimento, a dor do outro, desperta sempre em mim o bem, a minha total responsabilidade. O mal que está na mira do outro também me atinge, porque somos inteiramente responsáveis por ele. Esta concepção de Levinas tem uma analogia com a parábola do Bom Samaritano. A parábola do Bom Samaritano “pertence ao Evangelho do sofrimento. Indica, de facto, qual deve ser a relação de cada um de nós para com o próximo que sofre”.57 Não nos é permitido ser indiferentes. Portanto “Bom Samaritano é todo o homem que se detém junto ao sofrimento de outro homem”.58

Assistimos, certamente, ao sensacionalismo dos meios de comunicação, alardeando casos isolados com fortes apelos sentimentais ao ponto de banalizar o problema, anunciando o direito de todo ser humano ter uma morte feliz, sem sofrimento. Mas “o homem que é o «próximo» não pode passar indiferente diante do sofrimento alheio, e isso, em razão da solidariedade humana fundamental e em nome do amor ao próximo. Deve «parar», «deixar-se comover», como fez o Samaritano da parábola evangélica”.59 Isto traduz a conduta de um cristão.

Questionamo-nos: quem não sentiu já o mistério no rosto do Outro, do doente?

6. A dor e o sofrimento na perspectiva cristã

Do ponto de vista teológico, o sofrimento aparece como um mistério e um enigma indecifrável, cujo esclarecimento é possível a partir da palavra de Deus. O sofrimento é, em si só, uma experiência do mal, mas “Cristo fez dele a base mais sólida do bem definitivo, ou seja, o bem da salvação eterna”.60

Na perspectiva cristã, o sofrimento faz vir ao de cima o Homem-espiritual. O sofrimento “parece pertencer à transcendência do homem; é um sentido, «destinado» a superar-se a si mesmo; […] o sofrimento humano suscita compaixão, inspira respeito e, a seu modo, intimida”.61 O sofrimento humano é um enigma intocável, inevitável, logo, há um imperativo — aprender a lidar com ele.

O vocabulário do Antigo Testamento não possuía uma palavra específica para designar o sofrimento, este era denominado de “mal”. Portanto, o sofrimento era como um castigo do pecado. O sofrimento, nesta vida, não é maldição, pode ser um remédio amargo, até difícil de tomar, no entanto, é sempre remédio e oferecido por amor de Deus.

O livro de Job nasceu da preocupação de encontrar uma resposta a essa pergunta: porque sofremos? Seja qual for a resposta que encontremos, não podemos esquecer a verdade fundamental da nossa Fé, o nosso Deus. O sofrimento que Deus permite não pode ser um castigo, mas um sinal visível do seu amor por nós. Humanamente, o sofrimento tem valor, mesmo uma pessoa frívola dá mais valor ao aceitar a pessoa que sofre do que àquele que se entrega a uma vida fácil.

Em primeiro lugar, consideramos que não é possível falar do sofrimento de forma neutra, independentemente de uma antropologia, de uma teologia, de uma fé, das convicções e valores que tem a ver com a globalidade da existência humana: logo, faz todo o sentido o título da carta de João Paulo II “o sentido Cristão do sofrimento humano” e não, simplesmente, “o sentido do sofrimento”.

O livro de Job encontra-se nos limites do tolerável, é um livro pertinente acerca do sofrimento, onde se questiona: Porquê tanto sofrimento? Sofrimento dos inocentes? Será que Deus quer este sofrimento?! … O cancro, a sida, a fome…

Surge assim, o movimento dos porquê (Job 3, 11-12. 20. 23…). No referido livro um dos aspectos mais interessantes é a tentativa de justificar ou explicar o sofrimento de Job, assim como todo o sofrimento humano. Das suas palavras, podemos afirmar que Job torna-se porta voz de todos aqueles que, do fundo do seu sofrimento, apenas, reclamam pelo reconhecimento da sua dignidade e da sua conclusão de seres humanos.

A dor não custa, custa sim… uma dor sem sentido. Perante o problema da dor, podemos tomar duas atitudes: a fuga a todos os incómodos da vida, isto traduz o mais fácil, mais cómodo, ou uma atitude valente dos que se preocupam em fazer a vontade de Deus, com todas as suas consequências.

O tema sofrimento é um tema universal, que acompanha o homem em todos os quadrantes da longitude e da latitude terrestre. A palavra «sofrimento» parece ser qualquer coisa indispensável à natureza humana. É algo tão profundo como o homem, precisamente porque manifesta, a seu modo, aquela profundidade que é própria do homem e, a seu modo, a supera. O sofrimento parece pertencer à transcendência do homem.62 O homem torna-se caminho da igreja, principalmente, quando o sofrimento invade a sua vida.

O sofrimento é facilmente entendido, no Antigo Testamento, como castigo e não como provação. O Bom Samaritano é todo o homem sensível ao sofrimento, ou seja, que se comove frente à desgraça do “Outro”. É necessário, portanto, criar em si próprio a sensibilidade do coração, que se exterioriza na compaixão por quem sofre. Por vezes, a compaixão acaba por ser a única ou a principal expressão do nosso amor e da nossa solidariedade com o homem que sofre.63

João Paulo II refere que o Bom Samaritano não se limita à simples compaixão. O Bom Samaritano é, afinal, todo o homem que presta ajuda no sofrimento, seja qual for a sua raça ou espécie, dá a si próprio o seu próprio «eu», ao outro. Bom Samaritano é, precisamente, o homem capaz do dom de si mesmo.64

No Evangelho “Cristo ensinou o homem a fazer o bem com o sofrimento e, ao mesmo tempo, a fazer bem a quem sofre”.65 Só assim se percebe o sentido do sofrimento. Portanto, “o sofrimento deve servir à conversão, isto é, à reconstrução do bem no sujeito, que pode reconhecer a misericórdia divina neste chamamento à penitência. A penitência tem como finalidade superar o mal”,66 visa, finalmente, a própria salvação e, neste sentido, “o sofrimento, de facto, é sempre provação — por vezes, provação muito dura — à qual a humanidade é submetida. Sofrer significa tornar-se particularmente receptivo, particularmente, aberto à acção das forças salvíficas de Deus”.67

É uma verdade insofismável que “para descobrir o sentido profundo do sofrimento […] é preciso abrir-se amplamente à pessoa humana com as suas múltiplas potencialidades”.68 Contudo, “o sofrimento é, em si mesmo, experiência do mal; mas Cristo fez dele a base mais sólida do bem definitivo, ou seja, o bem da salvação eterna”.69 Sofrimento porquê? “Na verdade o homem não põe esta questão ao mundo, ainda que muitas vezes o sofrimento lhe provenha do mundo; mas põe-na a Deus”.70

O sofrimento pode e deve ser visto como uma grande oportunidade para encontrar o sentido da vida. O livro de Jó, como já foi referido, dá-nos um ensinamento para a prática daqueles que fazem do seu sofrimento a sua vida. A Bíblia é um guia da vida que na prática devíamos adoptar. Porquê tantos sofrimentos sem culpa? Tantas culpas sem pena? Job, o justo, é o exemplo paradigmático destas interrogações.

Também, e não menos importante, é essencial que os profissionais de saúde respeitem a liberdade religiosa de todos os doentes, e que cada um receba o apoio espiritual e religioso que desejar.

Na perspectiva teológica, o sentido profundo do sofrimento descobre-se seguindo a palavra de Deus revelada, é necessário “abrir-se amplamente à pessoa humana com as suas múltiplas potencialidades”.71 O cristão encontra, na doença e no sofrimento, uma forma de se aproximar de Deus na medida em que, onde os outros encontram angústia e dor, o cristão dominando e assimilando o sofrimento, retira dele um sentido de vida.72 Como nos ensina a Bíblia “o doente precisa da compreensão dum amigo, para não perder a fé no Deus todo- -poderoso” (Job 6. 14). Para os cristãos, Cristo é o único sentido da vida, portanto, a referência última para todas as opções. Senão vejamos em algumas expressões: “Ele é como uma árvore plantada à beira da água, que dá o seu fruto na estação própria, cujas folhas não murcham e tudo o que produz é bom” (Sl 1. 3), “Deus livra-te de muitas aflições e nenhum mal te atingirá” (Job 5. 19), “foi o Deus todo-poderoso que me criou e me deu o sopro da vida” (Job 33. 4), “Deus salva o oprimido da opressão, serve-se da desgraça para o avisar” (Job 36. 15).

Como já referimos, a vida humana é limitada, pois, logo que nascemos começamos a morrer. Cada um vai morrendo no “dia a dia… ” A dor faz parte da vida do nosso quotidiano. É necessário interpretá-la, fazer a sua leitura e conseguir tirar dela o melhor resultado no projecto da vida. É importante compreender que o sofrimento é, tão-somente, um limite humano.

Na perspectiva cristã é o sofrimento de Cristo que se torna salvação para o homem.

Qualquer sofrimento, quando assumido, reinterpretado, abre caminhos de salvação. Por exemplo, a mãe que sofre o problema do seu filho, o amigo que sente a desgraça de um amigo. Esta dor revela-se um desafio a atitudes novas, atitudes de redenção, salvação — libertação efectiva do problema que se está a viver. Assim, toda a dor pode salvar, pode provocar uma nova atitude perante a vida, perante os outros, perante si próprio.

O Evangelho é um código para a felicidade, segundo a palavra de Jesus: “o caminho da felicidade” (Sl. 1). Então, é um mandamento novo, não penalizador.

Eis a questão?! …

Será que a dor pode dar sentido à vida?

Quando a dor é muito forte e “bate à nossa porta”, temos oportunidade de olhar para a vida toda, avaliar o bem e o mal feito, perspectivar o futuro de outra forma, descobrindo, assim, o sentido da nossa vida.

Podemos, então resumir que o sofrimento recorda ao homem a sua condição “caduca”, abre o horizonte do infinito e do transcendente, reanima, eleva, faz-nos mais homens e mais mulheres.

Se a nossa vida tem sentido, ajudar os outros a encontrar o mesmo sentido do sofrimento é um apelo magnífico que chama à felicidade verdadeira “Felizes os que procuram a paz entre os homens, porque Deus lhes chamará seus filhos! ” (Mt 5, 9).

7. Entre o Servo de YHWH e o Semi-morto: narrativa do sofrimento

Pela “via do sofrimento”, segundo João Paulo II, na leitura da carta apostólica Salvifici Doloris enquadra-se a parábola do Bom Samaritano como pertencente ao evangelho da dor.73 A narrativa do Bom Samaritano serve, ao Romano Pontífice, para falar das atitudes que devem ser adoptadas perante o sofrimento do Outro (desvalido no caminho) e dos outros desvalidos (doentes, marginais, etc) para estarmos ao serviço da Boa Nova do Sofrimento. Com esta narrativa do sofrimento, o Santo Padre pretende, como ensinamento fundamental, que cada um desempenhe tarefas para com os demais, revelando-se pelo valor salvífico do sofrimento de Cristo na Cruz.74 Perante o sofrimento, não nos é permitido passar para o “outro lado da estrada”, como fizeram o Sacerdote e o Levita mas, antes, passar junto d’Ele, porque um Bom Samaritano será todo o homem (ateu ou crente) que se detém junto do sofrimento do Outro (meu próximo), qualquer que seja o sofrimento. Segundo o Papa, o Samaritano é todo o homem sensível ao sofrimento de “outrém”. Todo aquele que se comove diante da desgraça alheia e usa de misericórdia.75 Segundo o pensamento de J. Paulo II, Cristo, como Servo sofredor de YHWH, desperta, devido ao sofrimento, a “comoção das vísceras” (misericórdia) do Samaritano que, depois, acolhe e cuida da dor e do sofrimento do “semi-morto”. O homem, que é próximo, não pode passar indiferente perante o sofrimento alheio. Logo, em razão da solidariedade e vulnerabilidade humanas e em nome do amor ao próximo, devemos parar e deixarmo-nos “comover” tal como fez o Samaritano da parábola.^[76]

Não é sem motivo que, na linguagem corrente, se designe obra de Bom Samaritano toda e qualquer actividade em favor dos homens que sofrem ou precisam de ajuda.76 O Romano Pontífice, nesta carta apostólica, salienta, de forma clara, o anúncio do sofrimento de Cristo, na narrativa do Bom Samaritano, que desperta o “parar”, o “ver” e “encher-se de compaixão” para ajudar o próximo que sofre. Aqui aparece a parábola como narrativa do sofrimento, no caminho da Cruz, que se espera no Gólgota. A tal ponto que o Papa proclama esta parábola do Bom Samaritano como uma das componentes essenciais da cultura moral e da civilização humana, pensando em todos os técnicos de saúde que servem o próximo, que “sofre”, de maneira desinteressada, aplicando-se voluntariamente a dar ajuda como bons samaritanos e destinando, a essa causa, todo o tempo e forças do seu trabalho profissional. As acções do Bom Samaritano, segundo o pensamento do Papa, generalizam-se a toda a actividade social como o voluntariado hospitalar.77 Segundo o Romano Pontífice, a narrativa do Bom Samaritano refere-se como teologia da dor ou como vivência da dor em Cristo. E o “sofrimento”, entendido como dor total, está estampado no rosto e na vida do “semi-morto” que é Cristo, pela via da Cruz, metaforicamente representado no Desvalido do Caminho. Segundo João Paulo II, na dimensão subjectiva, o sofrimento parece quase inefável, intransferível e irrepetível no interior do homem. Parece haver, segundo esta parábola, a convicção de que o doente é o ícone do sofrimento.

O terreno do sofrimento é muito mais vasto, variado e pluridimensional. A experiência do sofrimento, como situação-limite, coloca a descoberto as perguntas mais radicais da sua origem, manifestando-se como enigma. Segundo o Papa, a realidade do sofrimento coloca a questão sobre a essência do mal, que parece inseparável do sofrimento. O homem sofre por causa do mal, que é uma certa falta, limitação ou distorção do bem. Poderia dizer-se que o homem sofre por causa de um bem do qual não participa, do qual é, em certo modo, excluído ou do qual se privou (privatio boni). Sofre-se, em particular, quando se “deveria” ter parte (participatio boni) em circunstâncias normais neste “bem” e não se tem. Logo, a realidade do sofrimento explica-se por meio do mal, que será sempre referido, de algum modo, a um bem.78 João Paulo II, na Salvifici Doloris, estabelece uma relação permanente entre o sofrimento e o amor. O sofrimento revela-se como efeito do amor e este surge como seu fundamento ontoteológico. Assim, a eloquência da parábola do Bom Samaritano está, sobretudo, no facto de o homem se sentir chamado, de maneira pessoal, a testemunhar o amor pelo “sofrimento”. Nenhuma instituição hospitalar pode auscultar o coração, a compaixão, o amor e a iniciativa, sempre que se trate de ir ao encontro do sofrimento alheio. Daqui o valor no que se refere ao sofrimento físico e mais ainda quando se trata do moral e, em especial, quando é a alma que está a “sofrer”.79 Na perspectiva do Romano Pontífice, a parábola do Bom Samaritano testemunha que a Revelação (segundo o evangelho do sofrimento) feita por Cristo, pelo sentido soteriológico do sofrimento, não O identifica, de forma alguma, com uma atitude passiva. Assim, o Evangelho é a negação da passividade diante do sofrimento. E, assim, afirma João Paulo II que o próprio Cristo é, neste aspecto, eminentemente activo pela Ressurreição.80 Quando a carta Salvifici Doloris diz Boni Samaritani parabola plene congruit cum agendi ratione Christi ipsius, melhor seria referir cum boni Samaritani parabola agendi Christi ratio plene congruit. Em primeiro lugar, será a passividade do “semi-morto” (Cristo no caminho para a cruz) e só depois é que vem a actividade do Samaritano (pela misericórdia) nos cuidados ao Desvalido pela via do sofrimento. João Paulo II termina a leitura, pela via do sofrimento, sobre a parábola do Desvalido no Caminho, procedendo ao seu enquadramento escatológico (juízo final).

As perguntas e respostas serão, no dia do Juízo (Mt 25, 34-45), acontecimentos da “parábola eterna” (Aeternum Verbum). O sentido teologal da parábola do comportamento exemplar expressa o acontecimento do homo patiens (desvalido no caminho) e referencia o éthos da ternura do Samaritano no epílogo do Juízo Final.81 Aos justos que perguntam quando Lhe fizeram as obras de misericórdia (Mt 25, 34-40), o Filho do Homem responderá: “Em verdade vos digo: Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes” (Mt 25, 40). Logo, a primeira e a segunda partes da declaração, sobre o Juízo Final, indicam como são essenciais para todos os homens, na perspectiva da vida eterna o “ver” e o “parar”, como fez o Bom Samaritano, junto do sofrimento do próximo, pela comoção das vísceras e, por fim, ao prestar cuidados.82 A narrativa do Juízo Final de Mateus recapitula a parábola do Bom Samaritano. A primeira recita tudo o que vai do páthos (desvalido no caminho) ao éthos (Samaritano exemplar) pela segunda narrativa (S. Lucas). Mas, o caminho inverso também é verdadeiro. Segundo a narrativa de Lucas, o Samaritano “passou” e “parou”, na estrada de Jerusalém a Jericó, e o? ìéèáíç? s passou pelo mesmo caminho de Jerico para Jerusalém, palco da Pascha (Páscoa), onde se desenrolaram os acontecimentos soteriológicos. Jesus Cristo, na parábola do Samaritano, está presente no “caminho”, como “semi-­morto”, para em Jerusalém estar como Vestigium Trinitatis (Cristo crucificado). Só o Filho do Homem poderá ser afirmado “desvalido” no caminho para a Cruz, como Vestigium Trinitatis, porque revelação de Deus-Pai e Verbum Incarnatum, que vem do Verbum Aeternum.83 A parábola do Bom Samaritano narra-nos dois acontecimentos da “palavra”, lógos, como Vestigium Aeternum:

- O acontecimento do páthos é metaforicamente dado no “semi-morto”, como Aeternum Vestigium, pelo rosto desfigurado de Deus no patíbulo do Gólgota;

- O acontecimento do éthos, ou da morada da conduta humana exemplar, no Bom Samaritano, revela-se como “Palavra actuante”. Esta Palavra, que se revela em pautas de comportamento externas e internas, segundo a parábola, recita-se em flexões verbais: passar, ver, parar, compadecer-se, ajudar (cuidar), levar, pagar, etc., que inferem uma “decisão poiética” (concreta e positiva): Vai e faz de modo semelhante (Lc 10, 37). A Cruz, como lugar do sofrimento e do abandono, já estava no caminho de Jericó a Jerusalém. Jesus morre cheio de pavor e angústia (Mc 14, 32-36) no meio de grandes clamores e lágrimas. Com a súplica no Gethsemani, começa o silêncio de Deus e, consequentemente, a paixão de Cristo tem o seu prelúdio na narrativa do Bom Samaritano.

A parábola do Desvalido no Caminho pertence ao evangelho do sofrimento como proémio do mesmo. A parábola do Bom Samaritano descreve-se como “proto-evangelho” do Sofrimento e manifesta-se como propedêutica às narrativas sinópticas da paixão e morte de Cristo. A narrativa lucana do Desvalido no Caminho apresenta-se como prólogo ao evangelho do sofrimento (segundo a leitura de João Paulo II). Assim se deverá entender a parábola do Bom Samaritano como introdução aos evangelhos soteriológicos. A narrativa exemplar enquadra-se, segundo Lucas, na viagem de Jesus a caminho de Jerusalém para a Paixão e Morte. A natureza do seu sofrimento tem a ver com o medo da separação de Deus. À medida que o tempo da salvação se aproxima, dá-se conta de que se não pode evitar o cálice (Mc 14, 36).84 O “semi-morto” encontra-se numa situação dramática a caminho do Calvário. Começa o abandono de Deus como prefácio da Cruz.

A singularidade da morte de Cristo será devidamente ressaltada se tivermos em consideração o seu relacionamento com Deus. Com efeito, será este relacionamento que dá ao acontecimento da Cruz uma expressão dramática, bastando atender ao grito de Jesus com as palavras do Sl 22, 2: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste” (Mc 15, 34; Mt 27, 46). Na parábola, o drama do sofrimento começa no silêncio do abandono na estrada. Na Cruz estará o “grito de dor”. Lucas substitui a expressão “abandono” pelas palavras da oração judaica, tiradas do Sl 31, 6: “Nas tuas mãos, entrego o meu espírito” (Lc 23, 46). No Evangelho de Lucas, os discípulos não fogem da Cruz, dado que, para eles, Jesus não morre como “abandonado”, mas como testemunho do comportamento exemplar (mártir).85 De outro modo, o Sl 22, na boca de Jesus, teria como interlocutor o Deus dos seus antepassados. Ao dizer-se isto representaria o fim da novidade da sua mensagem. Com efeito, o que está em causa na morte de Cristo não é o paradoxo da confiança em Deus, pelo abandono, mas a “divindade” do seu Deus e seu Pai.86 Para J. Moltmann, Jesus morre como “abandonado de Deus”, porque só a vida de Cristo distingue a sua Cruz das numerosas cruzes, sofridas por homens esquecidos sem nome e sem voz ao longo da história.87 Mas, aquele que foi abandonado pelo seu Deus e seu Pai é “ressuscitado”.

Então a fé escatológica deverá reconhecer na cruz de Cristo o caminho escatológico.88 Na Ressurreição, retoma-se a comunhão plena após a “passagem” vivida na Cruz. Esta é realidade e símbolo do sofrimento, que se manifesta como paradoxo entre a fealdade do pecado e a redenção do sofrimento e da dor. Segundo A. Couto, a Cruz é uma profecia para os olhos. Ela expõe o espectáculo do nosso pecado, da nossa cobiça, da nossa inveja e da nossa malvadez. Mas também é, sobretudo, o espectáculo do perdão de Deus. Jesus tinha, de facto, dito: quando eu for levantado da terra, atrairei todos a Mim. E já antes tinha associado o seu levantamento com o da cobra no deserto: como Moisés levantou a cobra no deserto (Nm 21, 8-9), assim é necessário que seja levantado o Filho do Homem (Jo 3, 14). Através desta associação, o corpo de Jesus sobre a Cruz é interpretado como o corpo da cobra (nu como o d’Ele) fixado num poste. A Cruz, que é sabedoria de Deus, faz ver que a malvadez existe e que é preciso vê-la, descobri-la, reconhecê-la, denunciá-la para dela sermos curados.89 Na sua poderosa impotência, o crucificado é a parábola que faz “ver” até onde a vista não alcança, bem dentro de nós, a crueza da nossa malvadez e n’Ele, em Deus, a força subversiva e nova do amor e do perdão.90 Na sua incapacidade, como Desvalido, o “semi-morto” será o crucificado que é narrativa viva do Pai e está na parábola, fazendo com que o Samaritano “veja” e depois “cure”, o que está em sofrimento.

Assim, o quarto Cântico do Servo de YHWH refere-se cinco vezes à “morte redentora” (Is 53, 1-12). Aqui, o sofrimento exprime uma entrega à vontade de Deus-Pai e contribui para expiação dos pecados dos homens (Is 53, 11). O Servo conhece o sofrimento, em toda a sua extensão, ao ponto de suscitar horror e desprezo (Is 52, 14-15; 53, 3). O Cântico do Servo sofredor contém uma descrição na qual se podem, de certo modo, identificar os passos da Paixão de Cristo em vários pormenores: prisão e humilhação na caminhada para a Cruz.

Segundo João Paulo II, mais do que esta descrição da Paixão, impressiona-nos, nas palavras do profeta, a profundidade do sacrifício de Cristo, que carregou com os sofrimentos de todos os homens.91 Na humilhação, pelas chagas e feridas do Servo de YHWH, saberemos “ver” (Is 52, 14-15) as nossas limitações e transgressões (Is 53, 5). Assim, veremos o espectáculo (Lc 23, 48) de Cristo crucificado diante dos nossos olhos (Gl 3, 1) e regressaremos batendo no peito (Lc 23, 48). Este espectáculo inicia-se no caminho de Jerusalém para Jericó, onde estava um “desvalido” disforme e fragilizado (Lc 10, 30). Era o Servo de YHWH (sofredor) que tomou sobre si o sofrimento de modo voluntário. Há uma continuidade entre o Servo sofredor e o “semi-morto” da parábola do caminho. As duas narrativas fazem parte do “evangelho do sofrimento” pelas leituras do primeiro e do segundo Testamentos. Na narrativa lucana do Bom Samaritano parece termos o “outro livro de Job. Pelo pensamento de João Paulo II, a linguagem da Cruz preenche a imagem da antiga profecia. Muitas passagens e discursos da pregação pública de Cristo atestam como Ele aceita, desde o princípio, o ”sofrimento" pela vontade de Deus-Pai para salvação do mundo. As palavras da oração de Cristo, no Gethsemani, provam a verdade do amor mediante a realidade do sofrimento. As palavras de Cristo, segundo a carta apostólica Salvifici Doloris, confirmam a verdade humana do sofrimento. Assim, o sofrimento consiste em suportar o mal diante do qual o homem estremece.

Precisamente, como também referiu Cristo, no Monte das Oliveiras, passe de mim este cálice.92 Com efeito, o sofrimento constitui um apelo e pretexto para manifestar a grandeza moral do homem e a sua maturidade espiritual,93 significando a formulação de duas questões: qual o sentido do sofrimento e se este será factor de humanização? Na sua mensagem pelo Reino de Deus, Cristo tornou-se “próximo” do mundo do sofrimento humano e “passou fazendo o bem”. Ao mesmo tempo, propôs as nove bem-aventuranças, dirigidas aos homens, em diversos sofrimentos. Cristo viveu o mundo do sofrimento humano, sobretudo, pelo facto de ter assumido sobre Si a dor e o sofrimento.94 Assim, o sofrimento não tem nenhum direito na criação de Deus, até porque o mal e o sofrimento não procedem de Deus. O livro de Job95 põe, de modo clarividente, a pergunta sobre o “porquê” do sofrimento e mostra, segundo João Paulo II, que ele atinge o “inocente”. Mas não dá a solução para esta magna questão. Somente a vislumbra e parece ficar ad limina doloris.96 Procura-se, assim, no livro de Job uma resposta “ao porquê” e “para quê” do sofrimento à luz de um novo conceito de Deus. O abandono de Deus, experimentado em Job, que se referencia como ponto de partida das lamentações do Antigo Testamento, torna-se o problema fundamental do próprio sofrimento, onde a grande pergunta está na relação do homem com Deus.^[98] O prólogo do livro sapiencial pretende explicar o sofrimento de Job pela influência de Satanás (Jb 1, 6-12). No entanto, os seus amigos, a sua esposa e ele próprio pensavam que a causa do sofrimento era Deus (Jb 1, 21; 2, 9-10).97

Job passa por um processo de amadurecimento onde há momentos de profundo desconforto. Onde está a minha esperança? Alguém viu por aí a minha esperança? Ela descerá comigo ao túmulo, quando juntos nos afundarmos no pó. (Jb 17, 15-16).98 Com efeito, Job não deixa de confiar em Deus apesar do seu profundo sofrimento (Jb 19, 25-26). Não se trata aqui de encontrar uma explicação lógica ou ontológica para o sofrimento. O que está em causa é a possibilidade de uma fenomenologia e de se conseguir uma linguagem adequada sobre Deus a partir do sofrimento. Segundo João Paulo II, no Evangelho do Sofrimento, pode dizer-se que, com a Paixão de Cristo, toda a dor humana se encontra em nova situação.99 Ainda, segundo o Romano Pontífice, na opinião manifestada pelos amigos de Job,, exprime-se a convicção de que se encontra presente o sofrimento na consciência moral da humanidade.

A ordem moral objectiva exige uma pena para a transgressão, para o pecado e para o crime. O sofrimento aparece como um mal justificado. A convicção daqueles que explicam o sofrimento como castigo, pelo pecado, apoia-se na ordem da justiça, o que corresponde à posição referida por um dos amigos de Job: “pelo que vi, aqueles que cultivam a iniquidade e os que semeiam a maldade, recolhem outro tanto” (Jb 4, 8).100 Na verdade, na perspectiva de M. Isidro Alves, esta relação baseia-se na “justiça”, tanto de Job que se confessa justo e integro (Jb 27, 5-6), quanto de YHWH a quem compete proteger, misericordiosamente, as suas criaturas.101 Todavia a justiça, no Antigo Testamento, significa precisamente esta relação entre duas pessoas. A justiça e a integridade, que Job reivindica, não designam a ausência do pecado (Jb 9, 2; 14, 4), aparecem, porém, como exigência da relação contraída entre Deus e o homem no próprio acto da criação.102 Segundo a Salvifici Doloris, Job contesta a verdade do princípio que identifica o sofrimento com o castigo do pecado e fá-lo fundamentando-se na própria situação pessoal. Por fim, o próprio Deus desaprova os amigos de Job pelas acusações e reconhece que este não é culpado.

O seu sofrimento é a dor de um inocente. O livro de Job não abala os fundamentos da ordem moral, fundada sobre a justiça, como são propostos em toda a Revelação, quer na antiga, quer na nova Alianças. Contudo, este texto sapiencial dramático demonstra que os princípios desta ordem não podem ser aplicados de maneira exclusiva e superficial. Se é verdade que o sofrimento se apresenta como um castigo, ligado à culpa, então já não será verdade que todo o sofrimento seja consequência da culpa e tenha carácter de pena. A figura do justo Job é prova convincente no Antigo Testamento.103 Mas, o segundo livro de Job revela-se nas narrativas da Paixão e Morte de Cristo. A narrativa dramática de Job não é a última palavra da Revelação sobre o sofrimento. A parábola do sofrimento, que se encontra em Lucas (parábola do Bom Samaritano), tem o seu epílogo na Paixão de Cristo. O sofrimento, na Revelação veterotestamentária, é um meio de correcção e disciplina, não nas mãos de um tirano inexorável, mas de um Pai extremoso (Jr 10, 24; 30, 11; 46, 28; Sb 3, 5). O modo antropomórfico de exprimir, no Antigo Testamento, o sofrimento de Deus será como um sofrimento pelo amor não correspondido (Gn 6, 6; Is 1, 2-5), dado que jamais se apresenta como sofrimento de fraqueza.104 Deus está junto dos que sofrem, porque “sofreu” no “semi-morto” (Servo das dores), quebrantado de coração.

Como diz certeira e belamente H. Küng: o seu amor não protege de todo o sofrimento, mas protege em todo o sofrimento.105 O sofrimento manifesta-se como instância “correctiva” da solicitude de Deus-Pai (Jr 10, 24; Sl 3, 1-9). Pelo Génesis, o sofrimento é resultante de uma falta ou da ruptura das relações do homem com Deus (Gn 3, 16-19). Mas aqui como não tem a última palavra, o sofrimento poderá ser “redentor” devido aos desafios que oferece.106 O Novo Testamento recapitula Jesus como o “homem das dores” que encarna a misteriosa figura do Servo de YHWH de Isaías e vem libertar o homem de todo o sofrimento (Lc 4, 18-21; Is 58, 6; 61, 1 s). Daqui que, na narrativa do Juízo Final (Mt 25, 31-46), se aluda novamente à luta contra o sofrimento. Assim, na parábola do Bom Samaritano, é o “semi-morto” a prefiguração de todo o sofrimento na Cruz.

Daqui que, segundo os sinópticos, o sofrimento prepara para acolher o Reino e, por isso, Jesus proclama “bem-aventurados” os que, por Sua causa, sofrerem injúrias, calúnias e perseguições (Mt 5, 11 s; Lc 6, 20-23).107 O Novo Testamento vê em Jesus e nos seus discípulos o convite a suportar o sofrimento e a viverem como “testemunhos”. A narrativa sinóptica do Bom Samaritano dá-nos o sofrimento do “semi-morto” como testemunho do cuidado e do interesse soteriológico. O “semi-morto” é um primeiro retrato da táðåßíùóéò paulina (Fl 2, 8), onde esta o “rosto” do sofrimento de Deus. Por isso, o “semi-morto” sofredor é modelo para um “discípulo conhecido” (Samaritano) que revela o “Deus desconhecido” do discurso de Paulo no Areópago de Atenas. Jesus despojou-Se da sua condição divina e tornou-Se semelhante aos “desvalidos no caminho” (da marginalidade, da doença ou da injustiça). O “semi-morto” é um símbolo do aniquilamento de Jesus Cristo. Na sua humanidade, Deus teve “compaixão” de nós e, pelo sacrifício da Cruz, restabeleceu-nos na Sua paz e no Seu amor. É o “semi-morto”, como misericórdia de Deus, que desperta, na narrativa de Lucas, a compaixão e a solidariedade do Bom Samaritano, porque o Samaritano Bom é todo o homem que vê e pára junto ao sofrimento de outro homem, de qualquer modo que ele seja… Bom Samaritano é todo o homem sensível ao sofrimento alheio… O Bom Samaritano é aquele que oferece ajuda no sofrimento, de qualquer espécie que seja… Bom Samaritano é o homem capaz de realizar tarefas, porque o dom é o “semi-morto” (desvalido no caminho do sofrimento).108 A humanização em saúde começa por um “desconhecido em sofrimento” (? íèñùðüò ôéò).

8. Atitudes perante a dor e o sofrimento

Será que podemos adoptar a ética de E. Levinas como código de conduta? E a perspectiva teológica?

Tendo por base a abordagem apresentada, é importante conceber a ética de E. Levinas num código de conduta. A chave do bem está na mão do outro. Por outro lado, esta ajuda ao Outro, concebida por Levinas, traduz e, bem, no nosso entender, uma atitude cristã, logo os profissionais de saúde devem adoptar estas duas perspectivas na sua conduta.

Um dos deveres éticos das profissões de saúde é aliviar o sofrimento do doente. Os profissionais de saúde cuidam, na sua globalidade, do ser humano. Cuidar, para os profissionais de saúde, é um fim em si mesmo, um compromisso em prol da continuação do processo de vida favorável ao crescimento daquele que é cuidado, à potencialização para se reabilitar, visando sempre a globalidade da pessoa e a sua promoção.

Alimentar a alma daqueles que sofrem para que a nível psicológico consigam arranjar forças dentro de si para superar a dor física, o cérebro comanda o nosso corpo e se a mente se mantiver desperta com a ajuda de palavras de esperança e de carinho, o corpo tenderá a harmonizar-se com a mente: Saber ouvir, falar, tocar, tratar a saúde das pessoas e só é grande sábio nesta arte quem consegue fazer das outras pessoas seres felizes, mesmo que durante um curto espaço de vida. Pois “se os cuidados de analgesia podem melhorar a dor, o sofrimento e a morte só poderão ser ultrapassáveis, se conseguimos vivê-los com a sensibilidade, que passando pelos neurónios, nos fazem capazes duma relação de solicitude com outra pessoa de igual dignidade”.109

Hoje, os avanços científicos na área da biologia e neurologia oferecem-nos um conhecimento de forma precisa a neutralização da dor. Assim, “é também ao sofrimento que se exige uma reformulação do seu sentido específico, na sua irredutível diferença”.110

À luz do conteúdo da circular normativa, já mencionada, é imprescindível que o profissional de saúde considere a dor como o 5º sinal vital. Saber avaliá-la será um desafio! …

Ajudar a pessoa em sofrimento “pressupõe um envolvimento humano-a-humano, baseado numa afectuosidade compassiva que pode incluir o sorriso aberto, ”toque caloroso“ e outras manifestações de carinho e de estima”.111 A dor e o sofrimento individual, relacionado com o direito à verdade, implicam uma maior informação e uma relação de deveres e direitos entre os doentes e os profissionais de saúde.

Será que "quando tratamos a dor permanece o sofrimento? Que fazer?

Há autores que afirmam que “a vivência da dor e do sofrimento requer uma perspectiva ecléctica, integradora da compreensão do fenómeno, sua avaliação e intervenção, tendo em conta sempre o sujeito no seu conjunto bio psicossocial”.112 O Papa João Paulo II afirma que “o homem que é o «próximo» não pode passar indiferente diante do sofrimento alheio; isso, em razão da solidariedade humana fundamental e em nome do amor ao próximo. Deve «parar», «deixar-se comover», como fez o Samaritano da parábola evangélica”.113

No hospital, a dor é uma área de estudo onde os cuidados paliativos podem ser promotores da qualidade de vida aos “sofredores”.

Cuidar dos doentes e ficar junto dos que morrem faz parte dos actos que diferenciam o ser humano do animal. Dame Cicely Saunders, pioneira nos cuidados paliativos, disse: “O sofrimento só é intolerável se ninguém cuida”.114 Não é aceitável do ponto ético sub-tratar ou não tratar a dor, mas na prática assistimos por vezes a um sub-tratar da dor. Devemos ter em atenção que a dor é um fenómeno que é quase tratável em todos os casos.

Negar o sofrimento de outra pessoa não faz com que ele desapareça. O sofrimento é subjectivo e é esta subjectividade que justifica a necessidade da empatia numa relação enfermeiro e doente. Se todos sofremos ao mesmo tempo em relação às mesmas situações e com a mesma intensidade teríamos a certeza de sermos compreendidos por toda a gente. Mas a realidade é outra, no sofrimento, tal como no nascimento e na morte, estamos sozinhos porque somos únicos. Perante o doente terminal, há que aproximar, parar e ter tempo de escutar e acompanhar quem sofre e que, em última análise, apenas espera outra mão para o ajudar.

Na nossa sociedade, o ideal da morte humana pode provir conteúdos diversos como o alívio da dor, acompanhamento, tratamento de sintomas ligados a uma doença terminal, assistência religiosa entre outros. Assim, devemos considerar o sofrimento do doente como integral, integrando vários aspectos tais como físicos, psico-afectivos e espirituais de forma a aliviar os sofrimentos de uma pessoa no fim da vida, de estar atento às suas necessidades, de respeitar o restante tempo de vida. Que fazer quando já nada há a fazer? Que atitudes adoptar? Quais as atitudes que os doentes podem esperar?

As atitudes frente à dor e ao sofrimento foram abordadas por L. Lavelle, que as denominou de negativas (o abatimento, revolta, a separação e complacência), e atitudes positivas, a advertência, o afinamento (purificação) e aprofundamento (penetração interior), a comunhão e a purificação. A primeira atitude positiva traduz que a dor é um sinal percursor de um perigo que nos ameaça; a segunda representa que a dor nos permite descobrir valores mais recônditos e subtis; a terceira atitude, diz-nos que através de uma comunhão, uma partilha na dor e sofrimento existe uma relação intensa entre o que sofre e aquele que o fez sofrer.115

O homem é capaz de agir e sofrer. Paul Ricœur justificou tal afirmação numa conferência sobre o mal, que proferiu em 1985. Indicou três dimensões humanas capazes de encarar os desafios do mal. A primeira refere que devemos renunciar à explicação do mal como se ele fosse uma explicação, não nos devemos "render; a segunda diz para deixarmos propagar a queixa contra Deus como Job e a terceira dimensão refere que nos devemos conciliar com Deus.116

O mundo que nos envolve não nos ensina a morrer. Julgamos que, por vezes, não podemos fazer grande coisa face ao sofrimento das pessoas que vão morrer e à sua morte, mas acreditamos que podemos, pelo menos, oferecer a nossa presença e a nossa atenção.

Qualquer dor envolve repercussões morais, o sofrimento. A dor não só abate a pessoa apenas no corpo, mas também quebra a evidência da sua relação com o mundo, altera o curso da vida diária e altera a relação com os outros. Ela impede a relação do ser humano com o mundo e, por isso, indica também sofrimento, o que faz com que a pessoa se sinta indiferente aos acontecimentos que se dão ao seu redor… retira o gosto por tudo.117

O doente deverá ser cuidado, enquanto pessoa, na sua singularidade, deverá beneficiar do tratamento que neutralize a dor, de acordo com a intensidade e, também, a natureza das suas dores. O alívio eficaz da dor exige uma extrema atenção ao doente e cuidados globais personalizados. “Cuidados globais implicam compaixão, não no sentido religioso da palavra, mas no seu sentido existencial, que é aproximar-se do outro a tal ponto e não haja praticamente separação entre os seus corpos”.118 Sendo assim, a presença, a voz, a mão sob a testa são um bálsamo para o “Outro” e alívio para o seu sofrimento. Mas, para compreender a dor do outro não é razoável a mão que se estende, o contacto físico, mas sim, um gesto “feito com a alma”.

O que fazer perante uma queixa? Devemos escutá-la, tentar compreender o que ela significa, qual o sentido que faz para o doente. Pois, tudo isto é uma forma de comunicar.

No ponto de vista de Kay Toombs, o corpo é apreendido como uma experiência vivida. O corpo representa o ponto de vista do eu no mundo, assim como a forma particular que cada um possui de estar no mundo, ou seja “eu não tenho ou possuo o meu corpo, EU SOU o meu corpo”. Não se pode separar o Eu do corpo.119 A dor repercute-se em todo o ser do homem e na sua relação com o mundo. Poderemos dizer que a dor e o sofrimento são reguladores da solidariedade ontológica. A dor e o sofrimento humanos são singulares e colectivos; singular porque o homem vive só com eles; colectiva porque com a dor e o sofrimento o homem pode tornar-se pior e/ou melhor em sociedade.

No pensamento de Cícero, os princípios de uma cura parte de uma longa reflexão. Os “consoladores” têm um papel imprescindível no tratamento destes estados de “desgraça”, retirando, acalmando, ou reduzindo-lhes o sofrimento. Seria muito bom eliminar o sofrimento moral.120 O sofrimento que sentimos pelo outro não é simplesmente pena, é um processo activo e racional de reconhecimento do outro como minha responsabilidade.121

Considerando o homem “um ser de relação” existe a necessidade que se aprenda a sofrer com o sofrimento do “tu”, o outro, que está ao nosso lado. Mas como afirma Robert Gibbs “o sofrimento não tem justificação” .122

A importância da relação empática, como domínio ético, nomeadamente nos cuidados de saúde, é abordada por Dorothy Owens.123 Para a autora cuidar empaticamente é reconhecer a alteridade do outro e o seu sofrimento, ou seja, a empatia assenta na reciprocidade da relação terapêutica entre o cuidador e o cuidado, entre o profissional de saúde e o doente.

A comunicação entre o doente e o médico é analisada por Laín Entralgo, onde o olhar, a palavra, o silêncio, a exploração manual e a exploração instrumental constitui o fundamento específico da mútua relação.

Na filosofia de E. Levinas, o futuro do mundo depende apenas do homem, pois é imprescindível que o homem pratique boas acções, arrependendo-se das injustiças, no entanto tendo presente como cristãos, a ética que Cristo nos ensinou, o bem, como escrito no livro da sabedoria, dar de comer a quem tem fome, visão aos cegos, saúde aos doentes… devemos distribuir o amor pelo mundo.

Devemos aceitar o sofrimento?

Perspectiva-se que tem de haver um processo de reconciliação (aceitar o sofrimento) para poder viver com ele.

Os defensores da distanásia dizem que matam para aliviar o sofrimento do outro, mas nem por isso andamos todos a matar-nos uns aos outros. Todos nós sofremos. As técnicas da medicina, a utilização precoce de medicação no controlo da dor exigem que sejam ouvidas as queixas do doente e que possa contar com a presença dos prestadores de cuidados junto de si. O reconhecimento do doente, como pessoa, é condição essencial para a eficácia dos cuidados prestados.

É fundamental ter consciência que “o recurso a uma maior utilização de morfínicos não é suficiente se existirem falhas na qualidade humana dos cuidados” .124 Estarmos atentos, o saber ouvir, o contacto físico e a presença são factores decisivos para o doente estar calmo. É verdade que "qualquer dor tem repercussões morais, logo, sofrimento.

Portanto, segundo a parábola evangélica, poderíamos afirmar como o Papa João Paulo II, que o sofrimento presente no nosso mundo humano, sob tantas formas, também está presente para desencadear no homem o amor; é precisamente esse dom desinteressado do próprio «eu» em favor dos outros homens, dos homens que sofrem.125

O sofrimento sem dor “é o sofrimento do vazio da espera, do silêncio na comunicação com o outro, do esgotamento antecipado do programa de vida”.126 O tratamento para o sofrimento espiritual, psico-afectivo é, essencialmente um remédio espiritual e psico-afectivo. Constatamos que a vida é dor, porque aquilo que nos faz viver é o desejo. Desejamos o que não possuímos, desejamos aquilo de que estamos privados. A privação é dor. Se o objectivo é estarmos vivos, então o objectivo do mundo é dor. Poderemos então afirmar que a verdadeira dor é a dor sem razão da dor.

É importante saber que nenhuma dor pode aniquilar o homem que está disposto a buscar o sentido dessa dor. O homem sem um sentido na vida pode levar ao pedido de eutanásia. Portanto, estar com a pessoa na hora da sua morte é participar com alguém de um momento único da sua vida. Segundo Kant, a dignidade do homem traduz-se no reconhecimento do direito que cada homem tem de ser reconhecido como um fim e nunca como um meio ao serviço dos fins dos outros. É importante que o profissional de saúde consiga fazer do sofrimento um grande encontro com o outro.

No hospital não se pode omitir a dor e o sofrimento. Morrer dignamente e com o mínimo de sofrimento, não é só morrer sem dor e desconforto físico, é também manter, até ao fim, a sua identidade pessoal, de ser pensante, de decidir e poder viver os últimos momentos rodeados daquelas pessoas e daquelas coisas que marcaram toda uma vida, usufruindo do afecto que elas podem transmitir e do sentido de alegria de saber que se é amado, que não se foi marginalizado por se ter tornado um peso demasiado.

A qualidade de vida é mais importante do que a quantidade e, quando um ou uma doente se encontra perto da morte, a sua autonomia tem de ser respeitada, devendo os cuidados/tratamento ajudar o indivíduo a morrer tão pacífica e confortavelmente quanto possível, ou seja, o ponto de vista do doente deverá ser respeitado e tomado em consideração devendo ser ajudado a morrer pacificamente e com dignidade.

A responsabilidade pelo Outro, para E. Levinas, tem em vista a questão dos direitos do homem e, neste contexto, na dor e sofrimento do doente em contexto hospitalar.127

Em jeito de conclusão e na óptica de E. Levinas, todo o profissional que exerce a sua capacidade cognitiva é sempre, responsável dos seus próprios actos, na óptica de E. Levinas.128 Assim, o sofrimento humano é intrínseco à natureza do homem e é uma forma de crescimento, de maturação moral, de sentido para a própria vida. “De que forma ou de outra, o sofrimento parece ser e é mesmo, quase inseparável da existência terrena do homem”129.

Após esta reflexão sobre a dor e o sofrimento podemos resumir esta abordagem com uma frase que, no nosso ponto de vista, resume todos os momentos: Cuidar o Outro é “silenciar” a sua dor, utilizando palavras afáveis e gestos técnicos sensíveis…

Devemos, pois, manter a esperança nos olhos tristes e carregados de sofrimento.

9. Conclusão

Se na cruz de Cristo Deus assume o sofrimento, então o sofrimento é uma linguagem que se pode utilizar para falar de Deus, porque ela foi utilizada pelo próprio Deus. Ao falar-se do sofrimento humano, este surge como inevitável; enquanto que em Deus é uma dimensão activa que procede do “dom” que Ele faz de si próprio (Jo 10, 17-18). O lado soteriológio será colocar a Cruz — símbolo de sofrimento — como acontecimento, onde Deus está implicado, justificando-se o sofrimento como condição redentora. Pelo relato de João Paulo II, a Cruz de Cristo vai ao encontro da Paixão e Morte com plena consciência da missão que deve realizar. Precisamente por meio da Cruz atingir-se-ão as raízes do mal, que se embrenham na história do homem e na sua alma. Assim, por meio da Cruz, Cristo realizará a obra da salvação. Esta obra, no desígnio do amor eterno, tem carácter redentor.130 No sofrimento, a Cruz revela-se pela instância soteriológica como refere o Romano Pontífice na Salvifici Doloris.

Na Cruz de Cristo não só se realiza a redenção através do sofrimento, como também o próprio sofrimento humano foi redimido. Sem ter culpa alguma, Cristo tomou sobre si todo o sofrimento e todo o mal do pecado. A experiência deste mal determinou a proporção incomparável do sofrimento de Cristo, que se tornou o preço da Redenção.131 O sofrimento possui um “sentido” porque constitui apelo a manifestar a grandeza ética do homem e a sua maturidade espiritual. Apesar do “sofrimento” ser uma “provocação”, expresso no paradoxo da fraqueza e da força, segundo S. Paulo (2 Cor 12, 9; Fl 4, 13; 2 Tm 1, 12), encontra na Cruz de Cristo o sentido soteriológico do qual participamos como adequadamente salienta o Sumo Pontífice: É assim com estas e com expressões semelhantes que as testemunhas da Nova Aliança falam da grandeza da Redenção, que se realizou mediante o sofrimento de Cristo. O Redentor sofreu em lugar do homem e em favor do homem. Todo o homem tem a sua participação na Redenção. E cada homem é, também, chamado à Redenção, participando no sofrimento, por meio do qual foi redimido.

Realizando a salvação, mediante o sofrimento, Cristo elevou o sofrimento humano ao nível de Redenção. Por isso, todos os homens, com o seu sofrimento, podem tornar-se participantes do sofrimento redentor de Cristo.132 Ao participar no sofrimento de Cristo, Deus-Pai não fica à margem da Paixão e do Sofrimento. Por meio deste, o crucificado surge como “imagem de Deus”. A compaixão, que tem uma parábola descrita pelo nome de Bom Samaritano, confirma a associação inseparável entre amor e sofrimento.133 Em linhas gerais, traçamos, neste trabalho, algumas definições de dor e de sofrimento, qual o sentido destes na vida humana: Abordamos o sofrimento na perspectiva do Outro em E. Levinas e na perspectiva teológica. Finalmente referimo-nos à dor e ao sofrimento em contexto hospitalar e atitudes a adoptar. Para os profissionais de saúde confortar a pessoa que sofre é reconhecido como um dever.

Verificam-se, contudo, nítidos paradoxos entre a exigência ética de aliviar o sofrimento do doente e a prática apoiada no modelo biomédico tradicional, orientada para a cura da doença enquanto disfunção. Mas, o desafio é aplicar a técnica revestida de cuidado. O sofrimento, para além de ser um problema, é um mistério que nos envolve. A proposta bioética é a grande proposta para o entendimento da condição humana, na qual o sofrimento ocupa há muitos anos, um lugar central. Miguel Unamuno afirmou que “quem não tiver sofrido pouco ou muito não tem consciência de si próprio”.134 Pois, por muito que se saiba de sofrimento, por muito que nos preparemos para esse momento, a verdade é que nunca estamos prontos para sofrer! O sofrimento faz parte de um mistério maior que o mistério da vida: Reconhecê-lo, dizê-lo e aceitá-lo é aceitar igualmente uma parte importante da nossa condição humana. Portanto, antes de mais, o sofrimento é uma questão humana, uma questão que desafia a nossa lógica e o nosso conhecimento da realidade. Mas, algumas dúvidas mantêm-se: Será que as nossas intervenções estão direccionadas para além do alívio da dor e do sofrimento? Será que estamos despertos para o apoio psicológico que muitas vezes é manifestado de uma forma obscura? Estas questões são desafios para futuras investigações que, por ventura, venham a ser realizadas. Em suma, acreditamos num mundo novo, pela terapia da compreensão e pelo cuidado do ser humano que sofre no seu íntimo.

Pactuamos com a pensamento de Paul Gilbert,135 devemos fazer uso da nossa inteligência, para que o mal se produza menos, sendo assim necessário deixar o palavreado, a falsidade, o orgulho, de forma a construir, em vez de destruir. Ainda, procurar a paz em vez da guerra, a vida em vez da morte.

10. Bibliografia

10.1. Livros

  • Bíblia de Jerusalém. São Paulo: 1981.
  • Frankl, Viktor E. — El Hombre Doliente. Barcelona: Herder, 1987, pp. 244-274.
  • Gameiro, Manuel — Sofrimento na Doença. Coimbra: Editora Quarteto, 1999.
  • João Paulo II — Carta Apostólica “Salvifici doloris”: Sentido Cristão do Sofrimento Humano. Secretariado Nacional do Apostolado da Oração. Braga: Editorial A. O., 1996.
  • Lavelle, Louis — Le Mal et la Souffrance. Paris: Plon, 1940.
  • Levinas, E. — Descobrindo a Existência com Hussel e Heidegger. Trad. do Francês Fernanda Oliveira. Lisboa: Instituto Piaget.
  • Levinas, E. — Ética e Infinito. Lisboa: Edições 70, 1982.
  • Levinas, E. — Totalidade e Infinito. Trad. do Francês de José Pinto Ribeiro. Lisboa: Edições 70, 1988.
  • Metzer, Aministiane — Cuidados de Enfermagem. Lisboa: Edições Técnicas e Cientificas, Lda, 2002.
  • Nunes, Etelvina — O Outro e o Rosto. Problemas de Alteridade em Emmanuel Levinas. Braga: Faculdade de Filosofia de Braga, 1993.
  • Pessini, Léo; Barchifontaine, Christian de Paul — Problemas Actuais de Bioética. 4ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 1997.
  • Schwob, Marc — A dor. Trad. do Francês de Lucinda Martinho. Lisboa: Instituto Piaget, 1997.

10.2. Artigos

  • Biscaia, Jorge — «Sofrimento e Dor Humana». In: Cadernos de Bioética, 9 (1995), pp. 7-14.
  • Botelho, Madalena — «O Significado do Sofrimento e da Morte nas Diferentes Culturas». In: Silva, João Ribeiro; Barbosa, António; Vale, Fernando Martins (Coord.) — Contributos para a Bioética em Portugal. Centro de Bioética Faculdade de Medicina Universidade de Lisboa, Edições Cosmos, 2002, pp. 327-335.
  • Cantista, Mª José — «O Segredo do Sofrimento ou o Sofrer em Segredo». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Uma perspectiva interdisciplinar. Lisboa: Campos das Letras, 2001, pp. 57-76.
  • Cantista, Pedro — «A Dor e a Clínica». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Uma Perspectiva Interdisciplinar. Lisboa: Campos das Letras, 2001, pp. 285-294.
  • Cicéron — «L’âme Malade». In: Cicéron — Devant La Souffrance. Évreux: Arléa, 1996, pp. 59-116.
  • Circular Normativa nº 9 — Direcção Geral da Saúde: A Dor como 5º Sinal Vital. Registo Sistemático da Intensidade da Dor de 14/06/2003.
  • Entralgo, Pedro Laín — «La Comunicacion entre el Médico y el Enfermo». In: Entralgo, Pedro Laín — La Relación Médico-Enfermo. Madrid: Alianza Editorial, 1983, pp. 300-349.
  • Frankl, Viktor E. — «Conceptos Básicos de Logoterapia». In: Frankl, Viktor E. — El Hombre en Busca de Sentido. Barcelona: Herder, 1979, pp. 95-128.
  • Gibbs, Robert — «Unjustifiable Suffering» . In: Robert Gibbs; Elliot R. Wolfson (edited by) — Suffering Religion. London; New York: Routledge, 2002, pp. 13-35.
  • Gilbert, Paul — «Le Mal: Problème ou Mystère?» In: Revista Portuguesa de Filosofia. 57 (2001), pp. 435-458.
  • Gonçalves, Arantes — «Da Sensação à Expressão da Dor». AA. VV. — Dor e Sofrimento — Uma Perspectiva Interdisciplinar. Lisboa: Campos das Letras, 2001, pp. 295-310.
  • Guerra, Marina Prista — «A Vivência Psicológica da Dor e do Sofrimento». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Uma Perspectiva Interdisciplinar. Lisboa: Campos das Letras, 2001, pp. 183-195.
  • Levinas, Emmanuel — «La souffrance inutile» In: Les Caihers de la Nuit Surveillée, 1984, pp. 107-119.
  • Magalhães, Vasco — «O sofrimento, que Solução para os Nossos Dias?». In: Cadernos de Bioética, 9 (1995), pp. 61-66.
  • Miranda, Gonzalo — «O Sentido da Vida e a Aceitação da Morte». In: Brotéria, 150 (2000), pp. 157-174.
  • Nunes, Etelvina — «Hieratismo do Rosto? Levinas aproximado dos seus interlocutores». In: Revista Portuguesa de Filosofia 50 (1994), pp. 291-303.
  • Nunes, Etelvina — «Que é ser Pessoa?». In: Cadernos de Bioética, 16 (1998), pp. 31-39.
  • Owens, Dorothy M. — «Medicine: Na Integrative Model of Empathy». In: Owens, Dorothy M. — Hospitaly to Strangers: Empathy and the Physician-Patient Relationship. Atlanta, Georgia: Sholars Press, 1999, pp. 89-149.
  • Sebastião, Luís — «A Pedagogia da Dor e do Sofrimento». In: Cadernos de Bioética, 9 (1995), pp. 41-45.
  • Serrão, Daniel — «A Eutanásia e o Direito de não Sofrer». In: Cadernos de Bioética, 9 (1995), pp. 29-34.
  • Serrão, Daniel — «Direitos das Pessoas Doentes». In: Brotéria, 143 (1996), pp. 495-501.
  • Serrão; Daniel — A Dor Humana e o Mistério do Sofrimento. In: Textos: Módulo «Fim de Vida», Iii Mestrado de Bioética, 2002/03.
  • Toombs, Kay S. -«The Body» In: Toombs, Kay S. — The Meaning of Illness: A Phenomenological Account of the Different Perspectives of Physician and Patient. Dordrecht; Boston; London: Kluwer Academic Publishers, 1993, pp. 51-88.
  • Veríssimo, André — «Banalidade do Mal: Morte e Esperança». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Abordagens. Lisboa: Campos das Letras, 2001, pp. 387-413.

  1. Citado em: Botelho, Madalena — «O Significado do Sofrimento e da Morte nas Diferentes Culturas». In: Silva, João Ribeiro; Barbosa, António; Vale, Fernando Martins (Coord.) — Contributos para a Bioética em Portugal. Centro de Bioética Faculdade de Medicina Universidade de Lisboa, Edições Cosmos, 2002, p. 327. ↩︎

  2. Cf. Gonçalves, Arantes — «Da Sensação à Expressão da Dor». AA. VV. — Dor e Sofrimento — Uma Perspectiva Interdisciplinar. Lisboa: Campos das Letras, 2001, p. 295. ↩︎

  3. João Paulo II — Carta Apostólica “Salvifici Doloris”: Sentido Cristão do Sofrimento Humano. Secretariado Nacional do Apostolado da Oração. Braga: Editorial A. O., 1996, p. 7. ↩︎

  4. Id., p. 8. ↩︎

  5. Cf. Ib. ↩︎

  6. Id., p. 10. ↩︎

  7. Cf. Id., p. 12. ↩︎

  8. Cantista, Pedro — «A Dor e a Clínica». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Uma Perspectiva Interdisciplinar, ob. cit., p. 183. ↩︎

  9. Biscaia, Jorge — «Sofrimento e Dor Humana». In: Cadernos de Bioética, 9 (1995), p. 7. ↩︎

  10. Sebastião, Luís — «A Pedagogia da Dor e do Sofrimento». In: Cadernos de Bioética, 9 (1995), p. 41. ↩︎

  11. Cantista, Pedro, art. cit., p. 284. ↩︎

  12. Gameiro, Manuel — Sofrimento na Doença. Coimbra: Editora Quarteto, 1999, p. 34. ↩︎

  13. Gameiro, Manuel, ob. cit., p. 21. ↩︎

  14. Cf. João Paulo II, ob. cit., p. 9. ↩︎

  15. Magalhães, Vasco — «O Sofrimento, que Solução para os Nossos Dias?». In: Cadernos de Bioética, 9 (1995), p. 61. ↩︎

  16. Serrão, Daniel — «A Eutanásia e o Direito de não Sofrer». In: Cadernos de Bioética, 9 (1995), p. 34. ↩︎

  17. Cf. Cicéron — «L’âme malade». In: Cicéron — Devant La Souffrance. Évreux: Arléa, 1996, pp. 59-116. ↩︎

  18. Sobre este parágrafo. Cf. Lavelle, Louis — Le Mal et la Souffrance. Paris: Plon, 1940. ↩︎

  19. Cf. Schwob, Marc — A dor. Trad. do Francês de Lucinda Martinho. Lisboa: Instituto Piaget, 1997, p. 58-90. ↩︎

  20. Id., p. 104. ↩︎

  21. Cf. Id., p. 58. ↩︎

  22. Cf. Id., p. 87. ↩︎

  23. João Paulo II, ob. cit., p. 9. ↩︎

  24. Cf. Schwob, Marc, ob. cit., pp. 64-65. ↩︎

  25. Circular Normativa nº 9 — Direcção Geral da Saúde: A Dor como 5º sinal vital. Registo Sistemático da Intensidade da Dor de 14/06/2003. ↩︎

  26. Ib↩︎

  27. João Paulo II, ob. cit., pp. 14-15. ↩︎

  28. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: 1981, pp. 632-645. ↩︎

  29. João Paulo II, ob. cit., p. 17. ↩︎

  30. Cf. Frankl, Viktor E.- El Hombre Doliente. Barcelona: Herder, 1987, pp. 244-274. ↩︎

  31. Cf. Frankl, Viktor E. — «Conceptos Básicos de Logoterapia». In: Frankl, Viktor E. — El Hombre en Busca de Sentido. Barcelona: Herder, 1979, pp. 95-128. ↩︎

  32. Miranda, Gonzalo — «O Sentido da Vida e a Aceitação da Morte». In: Brotéria, 150 (2000), pp. 161-162. ↩︎

  33. Miranda, Gonzalo, ob. cit., pp. 161-162. ↩︎

  34. Id., p. 165. ↩︎

  35. Levinas, E. — Ética e Infinito. Lisboa: Edições 70, 1982, p. 87. ↩︎

  36. Id., p. 88. ↩︎

  37. Id., p. 93. ↩︎

  38. Id., p. 112. ↩︎

  39. Cf. Levinas, Emmanuel — «La souffrance inutile» In: Les Caihers de la Nuit Surveillée, 1984, pp. 107-119. ↩︎

  40. Nunes, Etelvina — O Outro e o Rosto. Problemas de Alteridade em Emmanuel Levinas. Braga: Faculdade de Filosofia de Braga, 1993, p. 33. ↩︎

  41. Levinas, E. — Descobrindo a Existência com Hussel e Heidegger. Trad. do Francês Fernanda Oliveira. Lisboa: Instituto Piaget, p. 217. ↩︎

  42. Levinas, E. — Ética e Infinito, ob. cit., p. 77. ↩︎

  43. Ib↩︎

  44. Cf. Ib↩︎

  45. Cf. Levinas, E. — Totalidade e Infinito. Trad. do Francês de José Pinto Ribeiro. Lisboa: Edições 70, 1988, p. 204. ↩︎

  46. Cf. Ib↩︎

  47. Nunes, Etelvina — «Que é ser Pessoa?» Cadernos de Bioética, 16 (1998), p. 33. ↩︎

  48. Cf. Ib↩︎

  49. Nunes, Etelvina — «O Outro e o Rosto. Problemas de Alteridade em Emmanuel Levinas», ob. cit., p. 128. ↩︎

  50. Nunes, Etelvina — «Que é ser Pessoa?», art. cit., p. 34. ↩︎

  51. VerÍSsimo, André — «Banalidade do Mal: Morte e Esperança». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Abordagens. Lisboa: Campos das Letras, 2001, p. 394. ↩︎

  52. Levinas, E. — Totalidade e Infinito, ob. cit., p. 176. ↩︎

  53. Id., p. 190. ↩︎

  54. Nunes, Etelvina — «Que é ser Pessoa?», art. cit., p. 37. ↩︎

  55. Levinas, E. — Totalidade e Infinito, ob. cit., p. 190. ↩︎

  56. Cf. E. Levinas, Emmanuel — «La Souffrance Inutile», art. cit., pp. 107-119. ↩︎

  57. João Paulo II, ob. cit., p. 49. ↩︎

  58. Ib↩︎

  59. Id., p. 51. ↩︎

  60. Id., p. 45. ↩︎

  61. Id., pp. 6-7. ↩︎

  62. Cf. Id., p. 6. ↩︎

  63. Cf. Id., p. 50. ↩︎

  64. Cf. Ib↩︎

  65. Id., p. 54. ↩︎

  66. Id., p. 18. ↩︎

  67. Id., p. 37. ↩︎

  68. Id., p. 19. ↩︎

  69. Id., p. 45. ↩︎

  70. Id., p. 14. ↩︎

  71. Id., p. 19. ↩︎

  72. Cf. Biscaia, Jorge, art. cit., pp. 7-12. ↩︎

  73. Cf. João Paulo II, Epistula Apostolica Salvifici Doloris, in: Acta Apostolicae Sedis, 76, 3 (1984) nº 28, 243]. ↩︎

  74. Cf. A. Sarmiento, El Don de la Vida, documentos del Magistério de la Iglesia sobre Bioética, Madrid, B. A. C., 1996, 451. ↩︎

  75. Cf. AAS, 76, 3 (1984) nº 28, 243]; Cf. M. Renaud, “Solidariedade e Vulnerabilidade”, in: Cadernos de Bioética, 13, (1997), 7-13. ↩︎

  76. Cf. AAS, nº 29, 244. ↩︎

  77. Cf. AAS, nº 29, 245. ↩︎

  78. Cf. AAS, nº 7, 207. ↩︎

  79. Cf. AAS, nº 29-30, 246. ↩︎

  80. . Cf. AAS, nº 30, 246. ↩︎

  81. Cf. G. Ebeling, Wort und Glaube, II, Tuebingen, Mohr, 1969, 10-15. ↩︎

  82. Cf. AAS, nº 30, 247-248. ↩︎

  83. Cf. E. Jüngel, Dios como mistério del Mundo, trad. do alemão, Salamanca, Sígueme, 1984, 446-447. ↩︎

  84. Cf. J. Moltmann, “La pasión de Cristo y el dolor de Dios”, in: Carthaginensis, 13-14 (1992), 643. ↩︎

  85. À luz do Sl 22, 2 foi inicialmente visto este abandono, que Jesus terá pronunciado aquando do seu grito na Cruz (Mc 15, 34). Não é correcto interpretar o “grito de Jesus” a partir do Salmo, à luz da situação em que Jesus se encontrava. O Sl 22 é dirigido ao Deus da Aliança de Israel, em que o “abandonado” é um parceiro dessa Aliança, o justo sofredor. No caso de Jesus Cristo, não se trata do justo sofredor do Antigo Testamento, mas do próprio Filho de Deus. Todavia, o Sl 22 é um lamento, em sentido formal, onde o salmista não pede “compaixão” para si, mas pela justiça divina. Cristo não se limita a invocar a fidelidade do Deus de Israel, apelando à fidelidade do Pai para com o Filho. Daí que J. Moltmann entenda que o significado do grito de Jesus não é apenas “Meu Deus, meu Deus porque me abandonaste?”, mas também: “Meu Deus , meu Deus porque Te abandonaste?” [Cf. J. Moltmann, Le Dieu crucifié. La croix du Christ, fondement et critique de la theólogie chrétienne, trad. do alemão, Paris, Cerf, 1974, 176]. ↩︎

  86. Cf. J. A. Pinheiro Teixeira, Sofro, logo existo, Lisboa, Multinova, 2002, 96. ↩︎

  87. Cf. J. Moltmann, Le Dieu crucifié, 177. ↩︎

  88. Cf. Ibidem, 174. ↩︎

  89. Cf. A. Couto, Pentateuco: caminho da vida agraciada, Lisboa, Universidade Católica, 2003, 253-254. ↩︎

  90. A cruz faz ver ainda que Deus ama com um amor tão radicalmente subversivo que oferece o perdão à nossa malvadez, quebrando assim a espiral de violência, em que à violência apenas tínhamos para oferecer mais violência. [Cf. Ibidem, 254]. ↩︎

  91. Cf. AAS, nº 17, 220]. ↩︎

  92. Cf. AAS, nº 18, 223. ↩︎

  93. Cf. AAS, nº 22, 230. ↩︎

  94. Cf. AAS, nº 16, 218. ↩︎

  95. Cf. U. Eibach, “El dolor del hombre y su imagen de Dios” in: Selecciones de Teología, 23 (1984), 328. ↩︎

  96. Cf. AAS, nº 12, 212. ↩︎

  97. Cf. J. A. Pinheiro Teixeira, Sofro, logo existo, 30. ↩︎

  98. Cf. S. Terrien, Jó, grande comentário bíblico, trad. do francês, S. Paulo, Paulus, 1994, 52-53; Cf. M. Sousa Santos, “O livro de Jó e o problema do sofrimento humano”, in: Revista de Cultura Bíblica, 104 (2002), 121-129. ↩︎

  99. Cf. AAS, nº 19, 225. ↩︎

  100. Cf. AAS, nº 10, 211. ↩︎

  101. Cf. M. Isidro Alves, “O sentido do sofrimento na Sagrada Escritura”, in: Communio, 6 (1988), 489. ↩︎

  102. Cf. G. Von Rad, Théologie de l’Ancien Testament, I, trad. do alemão, Paris, Cerf, 1957, 353-361. ↩︎

  103. Cf. AAS, nº 11, 212]. ↩︎

  104. Cf. O. Rodenberg, “Vom Schmerz Gottes. Ein Beitrag zur biblischen Anthropomorphie Gottes” in: Theologicher Beitrag, 18 (1987), 174-193. ↩︎

  105. Cf. H. Kueng, Ser cristiano, trad. do alemão, Madrid, Cristiandad, 1978, 554; Cf. J. O. Carvalho, “O sofrimento no Antigo Testamento”, in: Communio, 8 (1991), 389-403. ↩︎

  106. Cf. J. A. Pinheiro Teixeira, Sofro, logo existo, 29. ↩︎

  107. Cf. M. D. Hooker, “Interchange and suffering”, in: Suffering and martyrium in the New Testament, Cambridge, University Press, 1981, 70-85. ↩︎

  108. Cf. AAS, nº 4, 203; nº 28, 247. ↩︎

  109. Cf. Biscaia, Jorge, art. cit., p. 12. ↩︎

  110. Cantista, Mª José — «O Segredo do Sofrimento ou o Sofrer em Segredo». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Uma Perspectiva Interdisciplinar, ob. cit., p. 61. ↩︎

  111. Gameiro, Manuel, ob. cit., p. 87. ↩︎

  112. Guerra, Marina Prista — «A Vivência Psicológica da Dor e do Sofrimento». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Uma Perspectiva Interdisciplinar, ob. cit., p. 195. ↩︎

  113. João Paulo II, ob. cit., p. 51. ↩︎

  114. Citado por Pessini, Léo; Barchifontaine, Christian de Paul — Problemas Actuais de Bioética. 4ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 1997, p. 285. ↩︎

  115. Cf. Lavelle, Louis, ob. cit↩︎

  116. Cf. Gilbert, Paul — «Le Mal: Problème ou Mystère?» In: Revista Portuguesa de Filosofia 57 (2001), pp. 435-458. ↩︎

  117. Cf. Metzer, Aministiane — Cuidados de Enfermagem. Lisboa: Edições Técnicas e Cientificas Lda, 2002, p. 132. ↩︎

  118. Metzer, Aministiane, ob. cit., p. 140. ↩︎

  119. Cf. Toombs, Kay S. -«The Body» In: Toombs, Kay S. — The Meaning of Illness: A Phenomenological Account of the Different Perspectives of Physician and Patient. Dordrecht; Boston; London: Kluwer Academic Publishers, 1993, pp. 51-88. ↩︎

  120. Cf. Cicéron — «L’âme malade». In: Cicéron — Devant La Souffrance. Évreux: Arléa, 1996, pp 59-116. ↩︎

  121. Cf. Gibbs, Robert — «Unjustifiable Suffering». In: Robert Gibbs; Elliot R. Wolfson (edited by) — Suffering Religion. London; New York: Routledge, 2002, pp. 13-35. ↩︎

  122. Cf. Gibbs, Robert, art. cit., pp. 13-35. ↩︎

  123. Cf. Owens, Dorothy M. — «Medicine: Na Integrative Model of Empaty«. In: Owens, Dorothy M. — Hospitaly to Strangers: Empaty and the Psysican-Pacient Relationship. Atlanta, Georgia: Sholars Press, 1999, pp. 89-149. ↩︎

  124. Metzer, Aministiane, ob. cit., p. 140. ↩︎

  125. João Paulo II, ob. cit., p. 50. ↩︎

  126. Id., p. 33. ↩︎

  127. Cf. Veríssimo, André — «Banalidade do Mal: Morte e Esperança». In: AA. VV. — Dor e Sofrimento — Abordagens, ob. cit., p. 402. ↩︎

  128. Cf. Id., p. 413. ↩︎

  129. João Paulo II, ob. cit., p. 6. ↩︎

  130. Cf. AAS, nº 16, 218. ↩︎

  131. Cf. AAS, n.º 19, 225. ↩︎

  132. Cf. AAS, n.º 19, 226. ↩︎

  133. Cf. J. Galot, Dieu souffre-t-il?, Paris, Cerf, 1976, pp. 116-118. ↩︎

  134. Citado em: Botelho, Madalena, art. cit., p. 327. ↩︎

  135. Gilbert, Paul, art. cit., pp. 435-458. ↩︎