Em J. Habermas e P. L. Entralgo: as linguagens comunicativas em saúde

1. Introdução

Sempre que um homem é solicitado, por outro, para o aliviar das suas dores, cuidá-lo, ajuda-lo, estabelece-se uma relação terapêutica. Esta deve ser antes de tudo constituída por uma genuína amizade entre iguais que tem esperanças objectivas e individuais, mas tem também uma esperança em comum — a saúde. Esta é uma constante preocupação do homem, ao longo da história, pois é grande a dificuldade de aceitação da doença ou morte súbita, sendo encarada de diversas maneiras conforme o tempo ou a cultura, mas sempre com sentimento de impotência. À medida que se conhece mais sobre as doenças vão-se esquecendo os doentes, pelo que a acção técnico-científica do profissional de saúde, deve ser cada vez mais apoiada pela arte de escutar e pelo diálogo estabelecido com o doente, sendo, por isso, uma relação de humanidade consigo mesma.

É no diálogo que se edifica o cuidado, porque ele é um movimento na direcção do outro, isto é, um «acontecimento verbal que toca na alma» de duas pessoas que se encontram na reciprocidade. Mas, para que ele se concretize, é necessário disponibilidade da parte de quem cuida e conhecimento compreensivo de quem é tratado. Conhecer o outro é possibilitar que ele se afirme na sua identidade, não como um sujeito universal mas sim na sua singularidade, na sua unicidade e particularidade como sujeito de liberdade. Daí a importância de falarmos de uma das capacidades específicas da natureza humana que é o falar. O homem é uma entitas loquens, que utiliza símbolos orais, escritos e gestuais, que comunica com o outro, para se sentir acompanhado, para sentir a proximidade primária e ontológica do outro.

É desta capacidade que falaremos, dando relevo à palavra e ao silêncio, que se estabelece entre dois seres humanos muito específicos: o profissional de saúde e o doente.

Inicialmente, Habermas acreditava que esse problema, sendo de ordem epistemológica, poderia ser resolvido através de um esclarecimento metodológico do status, de uma teoria duplamente reflexiva, em relação ao seu contexto de emergência e em relação à sua utilização, respectivamente. Daqui resultou a publicação do seu livro Conhecimento e Interesse, no qual a epistemologia é vista como a via regia para a fundamentação de uma teoria crítica da sociedade. Contudo, ao pensar nas implicações profundas da viragem linguística do pensamento, as quais possibilitam a estruturação de um pensamento pós-metafísico, Herbamas é levado a mudar de posição na tentativa de salvaguardar a teoria crítica da sociedade da aporia perfomativa, em que se encontrava depois de Adorno e Horkheimer terem radicalizado a crítica da razão, mediante a substituição da problemática da filosofia da consciência pela problemática da filosofia da linguagem. A teoria crítica da sociedade já não tem de provar as suas credenciais, em primeira instância, em termos metodológicos. E, em vez disso, precisava de fundamentos substantivos, que a conduzam aos domínios produzidos pela estrutura conceptual da filosofia da consciência e de superar o paradigma da produção, sem abandonar, no processo, as intenções do marxismo ocidental.1 A própria Teoría Crítica é surpreendida no final pela viragem linguística.2 O resultado dessa mudança de posição é a obra Teoría do Agir Comunicativo. Com esta mudança, a filosofia da consciência e a filosofia da história cedem o seu lugar relativamente à filosofia da linguagem e à teoria da acção comunicacional. À mudança de problemáticas teóricas corresponde uma nova fundamentação normativa pela teoria da acção comunicativa que se apresenta como fundamento da teoria crítica da sociedade.

Habermas denuncia a insuficiência desta distinção de Chomsky, alegando que não leva em consideração o facto das estrutura universais de possíveis situações linguísticas serem, elas mesmas, produzidas por actos linguísticos. Por um lado, essas estruturas não pertencem às condições limitantes extralinguísticas, sob as quais a competência linguística é, apenas, aplicada, uma vez que são dependentes da linguagem; por outro, elas também não coincidem com as expressões, produzidas pela competência linguística, visto que servem o aspecto pragmático dessas expressões. Dado que a linguagem humana não é explicável pelo simples concurso de competência e condições concretas, torna-se necessário tematizar uma “terceira dimensão”, que possibilite situar as outras duas. Habermas introduziu a distinção entre sentenças e proferimentos, afim de distinguir as estruturas, linguisticamente dependentes, das situações de fala das expressões linguísticas, usadas nessas situações. Sentenças são unidades linguísticas que constam de expressões linguísticas. Proferimentos são sentenças situadas, isto é, unidades pragmáticas da fala. Os contextos das situações determinadas de fala também constam de elementos extralinguísticos variáveis, que constituem o objecto da pragmática empírica. Contudo, em condições-padrão, voltam sempre, em cada situação linguística, a ter alguns “componentes universais”, produzidos, sempre de novo, pelo desempenho de determinada classe de expressões linguísticas. Estas estruturas universais das possíveis situações linguísticas constituem, para Hebermas, o objecto de uma pragmática universal, isto é, de uma “teoria da competência comunicativa”. A tarefa específica desta teoria consiste na reconstrução do sistema de regras, segundo o qual produzimos, enquanto tal, situações de fala possível.

A pragmática universal e a pragmática generativa de Chomsky são sistemas criativos, mas, entre elas, há uma diferença que Habermas explícita, recorrendo à teoria dos actos de fala elaborada inicialmente pelo Wittgenstein, e, posteriormente, por dois dos mais destacados membros da Escola de Oxford: J. L. Austin e John Searle. Na sua obra Os actos de fala, Searle formula a hipótese segundo a qual “falar uma língua é adoptar uma forma de comportamento regida por regras”. Desta hipótese decorrem duas consequências: em primeiro lugar, falar uma língua é executar actos de fala, tais como fazer afirmações, dar ordens, fazer perguntas, fazer promessas, etc., e, num domínio mais abstracto, referir e predicar; em segundo lugar, estes actos são, em geral, possíveis graças a certas regras para o uso de elementos linguísticos e é em conformidade com elas que eles se realizam. De acordo com isto, uma teoria da linguagem é parte de uma teoria da acção, porque falar é uma forma de comportamento, regido por regras. Ou, como diz Austin de modo mais enfático: dizer algo é fazer algo.3 Searle denomina actos de fala às unidades elementares da fala, na medida em que o falante, por meio da expressão, realiza a acção que a expressão performativa, empregada no proferimento, apresenta. Quando digo “prometo vir amanhã”, este proferimento é a promessa que ele apresenta. Declarações performativas têm simultaneamente um sentido linguístico e um sentido institucional, na medida em que possibilitam situar expressões linguísticas, isto é, fixam o seu próprio sentido pragmático. Com o auxílio de actos de fala, geramos condições universais para situar sentenças. Estas estruturas da situação de fala ocorrem na própria fala e correspondem àquilo que Habermas denomina universais pragmáticos. Um acto de fala gera condições para uma sentença poder ser mudada num proferimento. Contudo, esse acto de fala tem, ao mesmo tempo, a forma de sentença.

Uma teoria da competência comunicativa tem como tarefa explicar o trabalho, realizado pelo falante e pelo ouvinte, com o auxílio de universais pragmáticos, quando eles transformam sentenças em proferimentos. Falante e ouvinte, nos seus proferimentos, usam sentenças para estabelecerem um entendimento a respeito do estado das coisas. A própria estrutura, das unidades elementares da sentença, revela que um acto de fala é sempre composto por uma sentença performativa e por uma sentença de conteúdo proposicional, dependendo da primeira. A sentença dominante contém um pronome pessoal, na primeira pessoa, como sujeito, um pronome pessoal na segunda pessoa, como objecto e um predicado, que é formado com o auxílio de uma expressão performativa, na forma de presente. A sentença subordinada tem um nome e uma designação, como sujeito, que designa um objecto e um predicado, atribuído a um objecto ou dele negado. A sentença principal é usada, num proferimento, para estabelecer um modo de comunicação entre falante e ouvinte. A sentença subordinada é, por sua vez, usada para comunicar sobre objectos.

Nesta perspectiva, manifesta-se a estrutura da dupla dimensionalidade da comunicação da linguagem ordinária. Ela é, essencialmente, associação de um acto de fala e de uma sentença de conteúdo proposicional. Só se realiza verdadeiramente uma compreensão, quando pelo menos dois sujeitos atingem, ao mesmo tempo, ambos os níveis: o nível da intersubjectividade, no qual ouvinte e falante falam um ao outro; e o nível dos objectos, sobre os quais eles entendem. A sentença principal de uma declaração determina o modo da comunicação e, com isso, estabelece o sentido pragmático de uso para a sentença subordinada.

Contudo, nem todas as sentenças subordinadas, em proferimentos elementares, são proposições. No sentido da lógica simbólica, as proposições são sentenças que produzem factos. Toda a proposição contém duas suposições, em primeiro lugar, que existe o objecto sobre o qual se faz a proposição e que pode ser identificado e, em segundo lugar, o predicado atribuído ao objecto pertence-lhe efectivamente. Por esta razão, só as proposições podem ser verdadeiras ou falsas. Em virtude desta qualidade, as proposições são dependentes de declarações assertóricas, isto é, de uma classe de actos de fala, nos quais a sentença subordinada é usada no sentido de uma afirmação, de uma comunicação, de uma constatação ou de uma narração, etc. Contudo, em todos os outros casos de actos de fala, devemos atribuir às sentenças subordinadas um conteúdo proposicional; embora, nestes casos, não se trate de uma proposição, dado que não são usadas assertoricamente. Neste sentido, elas podem ser transformadas em proposições. Transformando-se o modo de comunicação, o conteúdo proposicional pode permanecer o mesmo. A unidade da fala tem essa estrutura duplo-dimensional, porque a comunicação, enquanto entendimento sobre objectos, só se realiza sob a condição de metacomunicação, isto é, de um atendimento ao nível da intersubjectividade sobre o sentido pragmático da comunicação.

Por isso, Habermas distingue entre um uso analítico da linguagem e um uso reflexivo da linguagem. O uso da linguagem pode ser referido como analítico, quando se emprega a metacomunicação apenas como meio para alcançar um entendimento sobre objectos. O uso é reflexivo quando a comunicação sobre objectos é usada como meio para se alcançar um entendimento sobre o sentido do uso das sentenças. A partir destas pressuposições fundamentais, Habermas tenta distinguir a sua teoria da competência comunicativa, da teoria da competência linguística de Chomsky, por meio de três abstracções. Quando abstraímos, num primeiro momento, dos componentes variáveis da situação de fala e só conservamos as estruturas universais, então, a partir do proferimento concreto, ganhamos o proferimento elementar, que foi introduzido como unidade pragmática da fala. Se, num segundo momento, abstraímos do desempenho do proferimento e só conservamos as expressões linguísticas, que são usadas na declaração elementar, então temos a sentença elementar, como unidade linguística. Se, num terceiro momento, abstraímos das expressões linguísticas, que determinam o sentido pragmático do uso da sentença, isto é, se pomos o acto da fala entre parêntesis, e só conservamos a sentença de conteúdo proposicional, então ganhamos a unidade elementar, necessária para reproduzir estados de coisas e, quando usada em dependência de sentenças assertóricas, tem como objecto as sentenças elementares, bem como as unidades fundamentais.

A pragmática universal tem como objecto os proferimentos elementares, enquanto unidades fundamentais, e, enquanto teoria da competência comunicativa, a sua tarefa específica consiste em reconstruir o sistema de regras, a partir das quais um falante, comunicativamente competente, constrói proferimentos a partir de sentenças e transforma proferimentos, noutros proferimentos.

A unidade fundamental da região de objectos da lógica dos predicados é a sentença declarativa elementar. A sua tarefa consiste em construir o sistema de regras, segundo o qual formamos sentenças declarativas e as transformamos, permanecendo constante a sua verdade. As sentenças declarativas devem ser consideradas funções de possíveis sentenças assertóricas, porém a lógica simbólica abstrai dessa conexão das sentenças declarativas com a respectiva classe dos actos de fala. Ela trata, ao mesmo tempo, de menos e de mais do que a linguística. Menos, pois ela faz abstracção de todas as expressões linguísticas, que se referem a situações de fala possível. Mais, porque, com o valor de verdade das sentenças declarativas, a lógica leva em consideração o facto de sentenças declarativas serem sentenças que, nas expressões, são usadas para a reprodução dos factos.

2. Universais Pragmáticos em saúde

Habermas começou por enumerar, em primeiro lugar, classes típicas de palavras, que se referem às estruturas das situações da fala:

  1. Pronomes pessoais (com dupla função performativa e referencial);
  2. Palavras e locuções usadas para iniciar a fala e dirigir-se ao outro;
  3. Expressões demonstrativas de espaço e de tempo; artigos, numerais e quantificadores;
  4. Verbos performativos;
  5. Verbos intencionais, não usáveis performativamente e advérbios modais.4

Estas expressões são denominadas universais (pragmáticos) precisamente por se coordenarem com as estruturas universais da situação da fala: as classes 1 e 2 com os falantes e ouvintes e com potenciais participantes na comunicação; a classe 3 com elementos temporais e elementos objectivos da fala; a classe 4 com a relação que o ouvinte tem com o seu proferimento, enquanto tal, na relação entre falantes e ouvintes; a classe 5 com as intenções e vivências do falante.

Considerar os universais pragmáticos, como componentes de uma metalinguagem, em que nos entendemos sobre os elementos da situação de fala, pode dar a impressão errónea de que as estruturas universais da situação de fala são dadas independentemente da fala, como condições marginais e empíricas do processo de comunicação linguística. Ora, segundo Habermas, só podemos usar sentenças em proferimentos, se com a ajuda dos universais pragmáticos engendramos as condições de comunicação possível e, com isso, a própria situação de fala.5 Sem referência a esses universais, não podemos definir os componentes invariantes nas situações de fala possível. Em primeiro lugar, os próprios proferimentos, depois as relações interpessoais que, juntamente com os proferimentos, se geram entre falantes e ouvintes, e, por fim, os objectos ou estados de coisas sobre os quais os falantes e ouvintes comunicam entre si. Uma situação de fala tem, assim, duas dimensões fundamentais: a da intersubjectividade, na qual os agentes estabelecem relações dialogais e, assim, podem emergir como sujeitos capazes de falar e agir; e a dimensão dos objectos, na qual há uma reprodução da realidade, como objecto de possíveis sentenças declarativas. Esses universais pragmáticos servem para apresentar a própria situação de fala. Para Habermas, a parte mais importante do acto de fala é a sentença performativa.

Até agora, a linguística e a filosofia analítica não foram bem sucedidas na apresentação de um sistema dos actos da fala. Apoiando-se na regra essencial de Searle, Habermas distingue quatro tipos de actos da fala:

  1. os actos comunicativos: servem para exprimir o sentido da fala, isto é, explicitam o sentido dos proferimentos, enquanto proferimentos. Qualquer conversa ou diálogo pressupõe uma pré-compreensão do que significa comunicar numa linguagem, entender ou entender mal os proferimentos, chegar a um consenso ou dirimir um desacordo. Exemplos: dizer, expressar-se, falar, perguntar, objectar, contradizer, etc.;
  2. os actos constatativos: expressam o sentido do uso cognitivo de sentenças, ou seja, explicitam o sentido das declarações, enquanto sentenças declarativas. Exemplos: descrever, comunicar, narrar, explicar, interpretar, etc.;
  3. os actos de fala representativos: servem para expressar o sentido pragmático da auto-apresentação de um falante a um ouvinte, ou seja, explicitam o sentido de expressões, intenções ou atitudes do falante. Neste caso, as sentenças subordinadas, de conteúdo proposicional, são sentenças intencionais como saber, pensar, querer, desejar, amar, odiar, manifestar, ocultar, etc.;
  4. os actos regulativos: exprimem a realização de acções reguladas institucionalmente, em contraposição às três primeiras classes, Não pertencem aos universais pragmáticos. Exemplos: saudar, agradecer, dar os pêsames, casar, apostar, baptizar, nomear, etc. Eles não pertencem aos “universais pragmáticos” por pressupor instituições, enquanto os universais constituintes do diálogo geram, primeiramente, as estruturas universais da situação da fala.

Os actos da fala possibilitam a realização de três distinções que devemos dominar, a fim de se poder entrar num processo de comunicação, entre ser e aparência, entre essência e fenómeno, entre ser e dever-ser.

O uso dos constativos possibilita a distinção entre um mundo público, intersubjectivamente reconhecido, e um mundo privado de puras opiniões.

O uso dos representativos possibilita a distinção entre uma essência totalmente individualizada em relação à qual, em cada acto de linguagem, os sujeitos, capazes de linguagem e de acção, levantam a pretensão de reconhecimento e os proferimentos linguísticos, expressões e acções, nas quais o sujeito aparece e que podem, por sua vez, ser objecto de sentenças declarativas (essência e fenómeno).

O uso dos regulativos possibilita a distinção entre regularidades empíricas, que podem ser observadas segundo regras de validade, que podem ser seguidas intencionalmente ou não (ser e dever-ser).

A consideração conjunta, dessas três distinções, possibilita a “distinção central” entre um consenso verdadeiro (real) e um consenso falso (enganador). Ora, essa distinção diz respeito ao sentido da conversa, enquanto tal, pois o sentido da conversa consiste em que, pelo menos, dois sujeitos se entendam sobre algo. Nesse caso, pressupomos sempre que o entendimento atingido seja real e verdadeiro. É claro que toda a classificação depende da tematização do princípio, a partir do qual ela é efectuada.

A saúde possui actos comunicativos, regulativos e representativos, com diversas falas entre os profissionais e os doentes. A humabização, em saúde, é compsta por diferentes actos, todos eles complementares e, naturalmente, interligados.

3. As linguagens comunicativas

A comunicação existencial é o surgimento conjugado e concriador de duas liberdades. Esta tem lugar entre dois seres, que vinculados entre si, devem seguir comodois. Para que a comunicação exista, o homem deve revelar-se ao outro sem reservas e sem reticências. Só comunicando com os outros, eu chego a ser o que sou. A comunicação é não só um acto de amor, mas também um combate. O amor é a fonte de comunicação e através desta se estabelece. «Graças ao amor, é possível que tu e eu, sendo e tendo que ser dois na ordem da existência empírica sejamos um na transcendência».6

Perguntamo-nos como é possível que dois sujeitos, onticamente estranhos, se comuniquem. Isto acontece pelo facto de que na verdade não são estranhos um ao outro, senão ontologicamente próximos. A expressão, com que se comunicam, não remete a um ser oculto por detrás dela, em cada um; a expressão é já a presença imediata e autêntica do ser. Citando P. L. Entralgo «O homem é o ser da expressão (…). O modo de dar-se, o homem na sua presença fenoménica, revela-o já primariamente como ser da expressão, quer dizer como próximo. O outro é espontanea e imediatamente apreendido como próximo por uma propriedade real, que o distingue desde logo metafisicamente: é o interlocutor, o sujeito livre de uma acção que, de qualquer maneira, terá de ser expressiva».7

O homem faz a sua vida falando e calando, emitindo palavras ou imergindo-se em silêncio; é simultaneamente ser vivente que pode falar e que quer ou não fazê-lo, e, ser vivente, que pode e quer ou não estar calado.

À expressão falada pertence essencialmente o silêncio. Falar é pronunciar uma série de palavras às quais precede ou põe fim um silêncio e em cujo curso os silêncios muito breves uns, mais longos outros, necessariamente se intercalam. «Só o silêncio em presença do tu — silêncio de todas as linguagens, espera muda na palavra não formulada, indiferenciada, pré-verbal — deixa ao tu uma liberdade e permite essa equilibrada contenção em que o espírito, sem se manifestar, está presente.».8 O inicial e súbito silêncio comunicativo do encontro faz-se logo palavra e através desta reciprocidade da acção interior toma a sua forma expressa e verbal.

A palavra é o que nos permite caminhar ao alcance daquilo de que carecemos, porque viver humanamente é existir, numa indigência remediável, ao necessitar de algo e procurar adequada satisfação da nossa carência. A palavra é o que nos torna possível epilogar a nossa experiência e movermo-nos até nova meta. A palavra expressa, de algum modo, parte da realidade daquilo a que se refere e da realidade daquele que a profere; e mais importante que a palavra, o silêncio trans-significativo de quem não fala, porque não têm palavras para expressar o que é sentido, porque o silêncio é a atitude da pessoa ante o inefável, ante o que humanamente não pode dizer-se.9

A comunicação interpessoal (o outro visto como pessoa) é composta por dois actos que constantemente se sucedem e se ligam entre si, um acto de inter-penetração e outro de intercâmbio de palavras, gestos e silêncios visível. Ao comunicar, o ser humano comunica-me com palavras e gestos uma parte da sua intimidade. Como salienta P. L. Entralgo: «A actividade compreensiva interpessoal pretende passar desde a expressão percebida à intenção, que nesta se expressou, para convivê-la co-executiva e compassivamente. Quem se expressa converte o interior em exterior; quem pessoalmente compreende aquele que se expressa, remonta-se desde o exterior ao interior e descobre por experiência própria, não só o que significa objectivamente a expressão do outro, seu “sentido objectivo”, mas também o que essa expressão significa na vida do homem a que pertence o “sentido pessoal”».10

No diálogo pessoal, uma conversação de duas pessoas, enquanto pessoas, a relação sujeito-objecto estabelece-se entre o que as palavras significam e o “nós” diádico, que a minha pessoa e a pessoa do outro constituem.

A palavra, na relação objectivante,11 é um mero signo audível de uma intenção objectivável e objectivante. Ao pronuncia-la, comprometo-me reduplicativamente (re — spondere), não com uma pessoa, mas antes com o sistema de vinculação contratual e pelas instituições objectivas a que eu e o outro pertencemos. Falando assim responsabilizo-me e comprometo-me com o “mundo”.

No diálogo interpessoal12 bem diferente é a sua significação. Enquanto minhas, as minhas palavras são causa de uma confissão, símbolo de uma doação e prenda de uma promessa; e enquanto partes de um conjunto coloquial unitário, são testemunho expressivo da minha pertença pessoal à díade que o outro e eu formamos. Confesso ao outro uma parte da minha intimidade, dou algo do meu próprio ser e prometo fidelidade à vinculação pessoal que a minha expressão declara. Sou eu, eu mesmo quem fala, mas no momento de falar eu sou “eu-em-nós”. Antes eu responsabilizava-me e comprometia-me com o mundo, agora, porém, a minha pessoa responsabiliza-se e compromete-se com a pessoa do outro.13

A comunicação que se estabelece no outro, como próximo, tem três elementos principais da convivência amorosa que são: o abraço, a doação mútua e o silêncio co-efusivo. O abraço é a saudação própria do encontro inter-pessoal, que significa, quase sempre, a livre vontade de oferecer a existência física ao “nós” “co-implicativo” e amoroso. Quem com amor pessoal abraça o outro, está dizendo com o seu gesto: “eu quero neste momento que a minha existência tenha como sujeito não o eu individual e desvinculado que nela podem engendrar o sentimento do meu próprio corpo, o meu pensamento objectivante, a minha consciência moral, o meu egoísmo, mas sim o nós que juntos formamos uma relação tu — eu”. Os actos de mútua doação, subsequentes ao momento inicial do encontro, são os mais diversos: gestos e olhares de carácter efusivo; obras de ajuda; palavras, etc. O silêncio co-efusivo deve contrair a alma, em verdadeiras núpcias, com a realidade e, por isso, é o silêncio um princípio de palavra — viva. Através deste silêncio principal e originário, a existência do silencioso enche-se dessa experiência radical e íntima que dá conteúdo e substância a toda a palavra.14

Mas a palavra mais autêntica e viva pelo simples facto de existir, determina a existência de quem a pronuncia e fixa-a num aqui e agora, pondo contornos no seu ser e interrompendo o fluxo contínuo da sua duração.

Quem silenciosa, imediata e amorosamente coexiste com o outro, sente que neste se faz diáfana a realidade e as notas principais dessa vivência são um sentimento de doação e de revelação. O silêncio não é incapacidade ou privação, mas sim testemunho radiante da plenitude que alcança a existência, quando transparentemente se entrega e se revela ao outro num “nós” diádico e co-efusivo. No falar amoroso, todas as palavras levam dedicatória.

A relação do profissional de saúde e doente é um vínculo interpessoal, que se estabelece através da palavra e em que se dão fenómenos transferenciais afectivos. Isto é,

a relação entre quem cuida e quem é cuidado, será mais do que uma simples partilha, porque em toda a situação de cuidados, experimentamos não só a relação com outrem, mas também a coexistência de uma dupla alteridade. Como diz Laín Entralgo, «desde o mesmo momento em que um homem se encontra com outro, entra com ele numa vinculação unitária e diversa»15. Nesta relação, para que haja uma boa comunicação entre ambos, é fundamental escutar o doente. As atitudes dos protagonistas são diferentes: o doente fala da sua patologia e, portanto, de si mesmo; o profissional de saúde não tem de e não deve falar de si, fala da realidade do outro que é o doente escuta, sente, interpreta e age. São estas atitudes diferentes, que analisaremos .

4. A Diferenciação das Formas de Comunicação

Além de sentenças usadas, nos proferimentos, podemos usar também acções ou expressões vivenciais (expressões corporais). Nos contextos de interacção, essas três classes de proferimentos linguísticos e extraverbais estão sempre associadas. Nas interacções mudas (acções e gestos), há proferimentos linguísticos pelo menos implicitamente. Nas conversas, as quais funcionam como acções comunicativas e em interacções, podem-se reconhecer os proferimentos, enquanto acção comunicativa, pelo facto de serem encaixados no contexto de proferimentos extralinguísticos. Nos discursos, porém, só são permitidos, tematicamente, proferimentos linguísticos. Portanto, acções e expressões não-linguísticas dos participantes podem acompanhar o discurso, mas não constituem os seus componentes.

Por isso, Habermas distingue duas formas de comunicação: a acção comunicativa ordinária e o discurso. Na acção comunicativa ordinária pressupõe-se, ingenuamente, a validade das conexões de sentido para trocar informações. O discurso é crítico. O seu tema é precisamente a problematização das pretensões de validade e não há neles troca de informação. O discurso tenta reconstruir, por meio da justificação, um acordo problematizado, que existiu na acção comunicativa ordinária. Ele tenta, pois, a superação da problematização da acção comunicativa e conduz a uma compreensão legitimada. Como escreveu Habermas:

Os discursos servem para a verificação das pretensões de validade problematizadas das opiniões e das normas. O único constrangimento admitido nos discursos é o do melhor argumento, como única motivação admitida pela pesquisa cooperativa da verdade. Os discursos são, sobre a base da sua estrutura de comunicação, libertados dos constrangimentos da acção.16

A acção comunicativa realiza-se em jogos de linguagem costumeiros e normativamente seguros, sendo os proferimentos, de todas as três categorias, que são não só formados de acordo com regras, mas associados de acordo com regras de complementação e substituição. O consenso, que acompanha as acções, refere-se tanto aos conteúdos proposicionais dos proferimentos (às opiniões), quanto às expectativas de comportamento, válidas intersubjectivamente pelas normas.

As conexões de sentido, ingenuamente válidas na acção comunicativa ordinária, podem ser classificadas em quatro níveis. Um jogo de linguagem funciona normalmente quando os sujeitos, capazes de falarem e de agirem, se compreendem nos seus proferimentos, de modo que:

  1. podem comunicar intencionalmente e em correspondência compreender o sentido pragmático da relação interpessoal;
  2. comunicar e compreender o sentido do conteúdo proposicional dos seus proferimentos;
  3. não põem em questão a pretensão de validade das opiniões que comunicam;
  4. podem aceitar a pretensão de validade das normas de acção, que se seguem em cada caso.

No caso de perturbações do consenso em a e b, pomos perguntas do tipo: Que queres dizer com isso? Como devo entender isso? A resposta é uma interpretação. No caso c: Ocorre assim? Por que ocorre assim? E a resposta é uma afirmação ou explicação. No caso d, perguntamos: Por que você agiu assim? E a resposta é uma justificação. Interpretações, explicações, afirmações e justificações, no contexto da interacção, fornecem informações. Contudo, não são suficientes para responder a questões que problematizam as próprias validades pressupostas. Essas perguntas exigem a apresentação de razões, que só podem ser fornecidas em discursos, que interrogam as interacções. Nesse sentido, o discurso tem por finalidade a fundamentação das pretensões na validade de opiniões e de normas. O discurso põe fora de acção todas as pressões da acção, isto é, todos os motivos com excepção da disponibilidade para a compreensão.

O mesmo pode ser dito em relação às pretensões de validade, presentes na acção comunicativa, que nos permite discutir sobre objectos e normas. Em que sentido se pode falar propriamente na pretensão de validade das normas? Habermas parte da análise de um fenómeno presente, intuitivamente a qualquer sujeito capaz de acção: quando temos diante de nós não um objecto, que podemos manipular, mas um sujeito, então, inevitavelmente, pressupomos a sua responsabilidade pessoal, isto é, só podemos entrar em interacção com ele quando supomos que seja capaz, quando solicitado, para justificar a sua acção, ou seja, de que ele poderia dizer por que, em determinada situação, se comporta assim e não de outro modo. Efectuamos aqui uma idealização, que também nos diz respeito, porque olhamos o outro sujeito com os olhos, com os quais olhamos a nós mesmos.

Este saber intuitivo, que, na realização da acção, tem o status de uma pressuposição, pode ser explicitado na forma de duas expectativas contrafactuais:

  • Se supomos no outro a presença de motivos inconscientes, então abandonamos o nível da intersubjectividade e tratamos o outro como objecto. Essa expectativa de intencionalidade implica a pressuposição de que o sujeito será capaz de transformar todos os seus proferimentos não-verbais, em proferimentos verbais;
  • Esperamos que os sujeitos só sigam normas que se consideram justificadas. Mesmo um sujeito que se submete a uma pressão fáctica deve, segundo pressuposição, ter princípios universais, segundo os quais possa justificar a sua acção. Essa expectativa de legitimação implica que, aos olhos do agente, só valem como justificadas as normas, das quais eles estão convencidos de que seriam capazes de resistir a uma discussão ilimitada e sem pressões. Por outras palavras, pressupomos que sujeitos responsáveis podem sair de um contexto de acção problematizado e atingir o nível do discurso.

Estas duas expectativas contrafactuais referem-se a uma compreensão atingível nos discursos. O sentido, portanto, das pretensões de validade pelas normas de acção consiste na promessa de que o comportamento fáctico dos sujeitos pode manifestar-se como acção responsável dos sujeitos. A validade de uma norma fundamenta-se na pretensão de justificação discursiva: supomos que os sujeitos possam dizer que normas seguem e por que as aceitam como justificadas.

Sabemos, por outro lado, que as acções institucionalizadas, normalmente, não seguem esse modelo de acção, puramente comunicativa, mesmo que façamos assim como se ele, de facto, fosse seguido e essa é a pressuposição para podermos tratar com homens que, nas suas objectivações, ainda não se tornaram totalmente estranhos a si mesmos, enquanto sujeitos. Na vida concreta do homem, há, sempre, desvios desse modelo puro. A partir desse fenómeno, podemos compreender um outro central na vida humana, isto é, o da ideologia, pois, se na vida real o normal é desviar-se desse modelo, pergunta-se, então, como podem, nesse caso, ser estabilizadas as perspectivas contrafactuais. Isso só é possível por meio da legitimidade nos bloqueios sistemáticos da comunicação formadora da vontade. A pretensão das normas é substituída por visões legitimadoras. A validade dessas visões de mundo é estabelecida numa estrutura de comunicação, que exclui a formação discursiva da vontade, enquanto impede quer a transformação de proferimentos extralinguísticos em linguísticos, quer a passagem flexível da acção comunicativa, quer ordinária para o discurso. Os bloqueios de comunicação, que tornam a imputação recíproca de responsabilidade uma ficção, apoiam igualmente a fé da legitimidade, que faz com que a ficção permaneça invisível e é, exactamente, o trabalho paradoxal das ideologias, cujo paradigma individual é a perturbação neurótica. Se as ideologias conseguem legitimar normas, por meio de uma pseudojustificação, porque elas não efectivam a sua pretensão de uma justificação discursiva, então falta-nos um critério universal e independente no qual nós, com segurança, possamos provar quando estamos numa consciência ideológica ou quando falamos, uns com os outros, sob as condições do discurso.

Podemos distinguir abstractamente cinco casos:

  1. o discurso enquanto meio de acção comunicativa (o ensaio informativo ou a conversa-disputa, organizada judicialmente);
  2. a acção comunicativa que falsamente levanta a pretensão de ser discurso (todas as formas de justificação ideológica);
  3. o discurso terapêutico que serve à reconstrução das condições do mesmo, por meio do estímulo metódico da auto-reflexão (o diálogo psicanalítico);
  4. o caso normal do discurso que serve para a fundamentação das pretensões de validade problematizadas (por exemplo, as discussões científicas);
  5. o discurso intencionalmente renovador (aprender por meio do discurso no lugar do discurso, enquanto meio de interacção).

Se a ideologia é a limitação sistemática da comunicação formadora do consenso, então não temos critério para a distinção clara dos casos b até e. Dependemos, nestes casos, de poder, enquanto participantes de uma comunicação, fazer, nessa mesma comunicação, a distinção entre os consensos verdadeiro e o falso. Já que a finalidade do discurso é atingir um verdadeiro consenso, devemos tentar esclarecer este em relação aos meios linguísticos do próprio discurso. Com isso, retomamos à pergunta, anteriormente levantada, pelo princípio de classificação dos actos da fala.

Habermas pretende indicar esse princípio com a afirmação de que, em cada discurso, somos obrigados a pressupor uma situação ideal de fala, isto é, a antecipá-la da mesma maneira que antecipamos a responsabilidade dos sujeitos agentes. Devemos fazer isso para poder ter um critério capaz de distinguir um consenso falso de um consenso verdadeiro e, assim, poder superar a consciência ideológica. Os quatro tipos de actos da fala, anteriormente apresentados, são os meios suficientes de construção de um projecto de fala.

5. Como interpreta o homem a sua vivência de doente pelas linguagens

Para o doente, a sua doença enquanto vicissitude de uma vida realmente pessoal, sempre foi, de uma maneira ou de outra, um evento formalmente pessoal. “O meu”, pode ser “meu” para mim como doente silencioso ou como objecto de livre comunicação com outra pessoa. Não importa que o doente só manifeste a “sua” verdade, é necessário que o faça pessoal e livremente.

Cabe então perguntar, mas de que fala o doente ao profissional de saúde, quando com ele se encontra, a que realidade aludem os seus discursos e os seus silêncios? Fala da sua doença, do que no seu juízo tem a ver com a sua doença e do que em relação com esta o profissional de saúde lhe pergunta. Fala de si mesmo enquanto doente, de tudo quanto na sua vida tem relação com a sua doença, do seu corpo, do mundo em que existe, da sua intimidade pessoal, ou seja, o doente falará ao profissional de saúde de quanto existe no seu mundo, no seu corpo e na sua intimidade que parece ter relação com a doença que o levou à sua procura. O doente é agente, actor e autor, enquanto a sua doença pertence à sua vida, mas é também doente, espectador e interprete dessa mesma doença. Como doente vive na sua alma o sentimento da sua doença, como espectador da sua vida contempla, dentro da sua biografia, o espectáculo da sua própria doença e o da sua condição e conduta de homem doente, como intérprete de si mesmo, percebe e inventa o significado, que tem para ele o facto de estar doente, como está e quando está.17

A notificação do doente durante a anamnése adopta dois modos cardinais: um testemunhal, em que o doente actua como relatador de si mesmo e outro interpretativo no qual é intérprete da sua própria doença. Testemunho e intérprete, enquanto doente, do seu mundo, do seu corpo e da sua intimidade pessoal, isto é, na notificação testemunhal o doente fala ao profissional de saúde, como testemunha, do seu mundo exterior com as suas vivências auto-sentidas e mais ou menos reprimidas. Pela palavra, o doente diz e descreve, por via indicativa, o que no seu mundo percebeu ou está percebendo; com o silêncio declara que, por qualquer razão, não pode perceber ou que na sua experiência perceptiva deliberadamente quer calar. Ao falar como testemunha do seu corpo, ora contemplando-o desde fora, ora sentindo-o desde dentro, declará ao profissional de saúde, auto-sentimentos, auto-vislumbres e noticias configuradas mediante expressões sonoras, para-verbais, palavras e silêncios. No testemunho da sua intimidade, que não pode ser a-corpórea, nem ultra-corpórea, mesmo o mais “espiritual” tem presente a experiência do corpo, pode no entanto, objectivar na sua consciência conteúdos que não façam referência imediata ao seu corpo, como por exemplo, a comunicação da tristeza, do medo, da esperança, do desespero. O objecto percebido adoptará umas vezes forma de “ideia” e outras, forma de “sentimento” ou “afecto” e o doente dirá então o que pensa ou o que sente.

Não há na anamnése clínica, uma notificação puramente testemunhal, entendida esta, como declaração puramente passiva do que, sem intervenção deliberada do sujeito, chega a haver na sua consciência. A forma mais “neutra” e impessoal da notificação, aquela em que o sujeito comunica ao outro o nome do que vê, supõe uma elaboração pessoal maior ou menor da realidade intra-psíquica: se a simples percepção é já um “comportamento”, muito mais o será a expressão nominal do percebido. Dar nome é, em alguma medida, interpretar; toda a testemunha é um intérprete, mesmo quando testemunha acerca do que está vendo. E como não há imaginação, sem experiência subjacente, tão pouco há testemunho sem imaginação. A notificação, em síntese, pode ser preponderantemente testemunhal ou interpretativa, nunca existe na forma pura.18

Na notificação interpretativa, o doente diz ao profissional de saúde o que para ele é aquilo que encontra na sua vida e aquilo que ele, como autor de si mesmo, pôs na realidade e na experiência do seu estado morboso. Na notificação testemunhal, a doença pertence à esfera do “em-mim”; na notificação interpretativa, a doença entrou pessoalmente na esfera do “meu”. Como proclama P. L. Entralgo: «Só interpretando-a pode ser verdadeiramente minha a minha vida».19 A interpretação do doente pode ter como tema principal a experiência relativa ao mundo exterior, a concebida no próprio corpo ou a concernente à própria intimidade. O doente converte a pura percepção de si mesmo, na interpretação pessoal do que está no seu mundo, no seu corpo e na sua intimidade percebeu, ou seja, a inteligência humana é constitutivamente interpretativa e, portanto, o homem não pode viver sem interpretar o que vive.

No processo de interpretação, existem vários pontos a considerar: a qualidade da vivência originária, o facto de que esta seja ansiedade, orientará, num sentido ou noutro, a sua ulterior interpretação; o estado da consciência psicológica; a constituição psicofísica do sujeito; o passado biográfico do doente; o futuro possível do doente, ou seja, seus projectos e suas esperanças; as crenças vivas na alma do que interpreta; a ideia de si mesmo.20 Com o conhecimento destes pontos, o profissional de saúde poderá entender, casual e compreensivamente, o mecanismo da operação interpretativa do doente.

Pode-se dizer que o doente interpreta a sua doença para possuir-se (numa radical tendência da pessoa à apropriação ou à auto-posse), para ser plenamente “eu mesmo” e fá-lo, querendo-o ou não, tantas vezes quantas a doença criar raízes, na sua vida, e só assim estará verdadeiramente justificada a expressão: a minha doença.21

6. Como vive o profissional de saúde a realidade da comunicação

O homem, por muito forte, racional e desmistificador que seja, quando de facto se sente doente, será sempre uma criatura vulnerável e necessitada, não só de uma ajuda “humanamente técnica”, mas sobretudo “humanamente humana”. O bom profissional de saúde, tendo em conta este sentir humano, esta esperança na omnisciência médica, deve cada vez mais utilizar um cuidar personalista, com uma rigorosa necessidade de diálogo e de escuta, com um total conhecimento da realidade do outro. A maneira como o profissional de saúde chega ao conhecimento dessa realidade é através da interrogação. O profissional de saúde interroga o doente sobre a vida deste, enquanto esta tem a ver com a génesis, com a configuração ou a significação da doença; da incitação, ou seja, além de interroga-lo, o profissional de saúde deve incitar com frequência o doente a prosseguir um relato começado ou a completar, com dados novos, o que até esse momento declarou; da orientação efectivada com firmeza na direcção do colóquio anamnésico, mas também com delicadeza; da sugestão quer no campo para o qual se deve dirigir a atenção do doente para se chegar a um diagnóstico, quer a nível do tratamento, quer a nível do convite a dizer algo; o profissional de saúde deve saber mover-se entre o silêncio e a palavra ou «entre o silêncio e o silêncio através da palavra». O colóquio entre o doente e o profissional de saúde deverá ser, por parte deste, um contínuo trânsito da objectivação até à “coexecução” interpretativa e desta até aquela.22

Existem outras formas de comunicação entre o profissional de saúde e o doente, durante e após a anamnese, são o contacto manual e a relação instrumental. No entanto, não deverá ser uma forma do profissional de saúde dissimular a sua insuficiência técnica nem a sua incapacidade de escutar. No contacto manual, o profissional de saúde explora com as suas mãos o doente. Através do tacto evidencia-se e efectiva-se a realidade do mundo exterior. Tocar o corpo vivente de uma pessoa é, antes de tudo, adquirir uma experiência táctil da liberdade alheia, visto que ao explorar o corpo do doente, o profissional de saúde não tenta possuí-lo, nem modifica-lo, mas sim conhecê-lo. Porém, tal como na relação, o corpo pode ser tocado como intenção de puro objecto ou como corpo pessoal, ou seja, como morada vivente de uma pessoa. No entanto, a exploração táctil não seria uma tarefa técnica se o profissional de saúde não reduzisse intencionalmente nela o corpo do doente à condição de “objecto tangível” e não seria também uma actividade humanamente técnica se não tratasse o corpo do doente como morada pessoal, como organismo no qual e pelo qual se faz tangível uma pessoa.

O tecnicismo da Medicina é um dos aditamentos mais visíveis dos cuidados de saúde do século XX. E muito mais há a esperar do século Xxi, que vai numa década. O instrumento exploratório é um recurso técnico que serve para alargar as possibilidades cognoscitivas e operativas do profissional de saúde, algo com o qual se prolongam e afirmam os olhos e as mãos deste. O doente vê-o como um recurso mágico, que alarga as possibilidades diagnósticas e terapêuticas do profissional de saúde. A sua importância é sem dúvida crescente, mas para o profissional de saúde que queira praticar rectamente os seus cuidados nunca deverá ser “tudo” e particularmente nunca poderá ser um “muro de separação” entre o profissional de saúde e o doente necessitado do contacto pessoal. O imparável avanço da tecnologia e da ciência biomédica, na sociedade contemporânea, exerce um forte poder de encanto no imaginário social. Assim sendo a confiança que antes se depositava na figura do profissional de saúde, liga-se agora à fiabilidade dos instrumentos e à aparente neutralidade da informação. Neste tipo de sociedade, os cuidados de saúde convertem-se noutro bem de consumo e, assim, o profissional de saúde e o doente fazem-se consumidores de análises, receitas, radiografias, fármacos e informações. Neste sentido, o profissional de saúde, perante as dificuldades na sua relação com o doente, perante a falta de autoridade, volta o seu olhar para a tecnologia, como forma de recuperar o credito frente ao seu doente, e coloca-se por trás dos seus papéis, gráficos e instrumentos.23

O crescente domínio científico e técnico nunca deverá anular a perplexidade que denuncia, em cada relação profissional de saúde e doente, as perguntas que cada ser humano tem frente ao sofrimento próprio e alheio. Antes de um saber, a clínica é uma relação da humanidade consigo mesma. Marafión diz: «há que procurar com mais afinco o homem na doença e não a doença no homem; cada doente é um mundo, mas é-o porque cada homem é diferente dos outros, enquanto que a doença é sempre igual a si mesma».24

7. Conclusão

Desta reflexão, podemos dizer que se fossemos capazes de conciliar o valor da ciência e da tecnologia, ao mesmo tempo que a arte e a ciência das relações inter-humanas, do cuidado humano e total do homem, a verdadeira comunicação médico- doente seria alcançada.

P. L. Entralgo reflectiu e escreveu muito sobre o papel da comunicação entre os homens, pois é a fala uma das características fundamentais e específicas da natureza humana. Poder falar e poder calar pertence à sua essência. A fala tem várias funções de ordem social, convencional, subjectiva e íntima. Assim, P. L. Entralgo deu especial importância á comunicação na relação profissional de saúde — doente e no que corresponde à palavra e ao silêncio. O profissional de saúde está presente nos momentos difíceis da vida do doente, mas só com uma escuta respeitosa, como igualmente numa vinculação afectiva, que se denomina “amizade”.

Nas suas várias formas e nos diferentes tipos de relação, a comunicação deverá assumir um papel libertadora, que passará per naturam suam pela transmissão da intimidade.

A estrutura da comunicação só produz sujeitos quando há, para todos os possíveis participantes, uma distribuição simétrica das oportunidades de escolher os actos de fala e realizá-los. Desta suposição universal de simetria, é possível deduzir suposições especiais para os quatro tipos de actos de fala: por exemplo, suposições de simetria para os comunicativos e para os constatativos, isto é, distribuição das oportunidades para interpretações, afirmações, esclarecimentos, justificações, etc. No entanto, as condições da situação linguística ideal ainda não foram completamente asseguradas, na medida em que ainda não temos garantia para saber se os dialogantes apenas julgam que realizam um discurso, quando na realidade estão numa comunicação sob coerção, nem sabemos ainda se os dialogantes não se enganam a si mesmos ou enganam os outros a respeito das suas intenções. A situação linguística ideal exige determinações, que se relacionam com os discursos, imediatamente pela organização de contextos de acção. Certamente, a liberação do discurso de todas as coerções só é possível sob condições de acção comunicativa pura.

A distribuição simétrica de oportunidades na escolha e na realização de actos de fala, que se referem: a) a proposições enquanto proposições; b) à relação do falante com os seus proferimentos; c) ao seguimento de regras, são determinações teórico-linguísticas para aquilo que tradicionalmente tentamos captar com as ideias de verdade, liberdade e justiça. Elas interpretam-se mutuamente e juntas definem uma forma de vida que concede validade à máxima de que deveria resultar um consenso, que per se é um consenso verdadeiro. A situação linguística ideal é considerada aqui não por meio de características pessoais de falantes ideais, mas por meio de características essenciais de uma situação possível da fala. Essa construção tem a intenção de provar que cada falante, comunicativamente competente, que pretende participar num discurso, tem de fazer necessariamente essa antecipação e só o pode fazer com o auxílio dos quatro tipos de acto da fala.

O status desta antecipação necessária depende do afastamento de dois possíveis mal-entendidos: manifestamente, ou pelo menos na maior parte das vezes, as condições da fala empírica não são idênticas às da situação linguística ideal. Contudo, pertence à estrutura da fala que os participantes, na execução dos actos de fala, ajam contrafactualmente para que a situação ideal da fala não seja pura ficção, mas real. A isto Habermas chama uma pressuposição. O fundamento normativo do entendimento linguístico é antecipado, mas, enquanto fundamento antecipado, é real. Esta antecipação formal do diálogo idealizado garante o acordo definitivo e contrafactual que liga a priori falantes e ouvintes. Dado que facticamente realizamos tal pressuposição, o conceito de uma situação ideal da fala não pode ser um puro princípio regulativo em sentido kantiano. No entanto, esta situação não é uma situação existente, uma vez que nenhuma situação fáctica se adapta a ela. Ela seria comparável a uma ilusão transcendental, se tal ilusão não fosse, como é o caso, condição constitutiva da fala possível. Esta antecipação tem para cada comunicação possível a forma de uma ilusão constitutiva, que é simultaneamente uma manifestação prévia de uma forma de vida. As normas fundamentais de toda a comunicação possível, explicitadas pela pragmática universal, são apenas “hipóteses práticas”, a partir das quais se elabora a teoria crítica da sociedade.

Nesta perpectiva, Habermas desenvolve a tese de que qualquer agente comunicativo, na execução de uma qualquer acção linguística, levanta pretensões universais de validade e deve pressupor a sua legitimação. As pretensões universais são as seguintes: expressar-se compreensivamente, dar a entender algo, fazer-se compreensível, compreender-se mutuamente. O falante deve escolher uma expressão compreensível, a fim de que falante e ouvinte possam compreender-se mutuamente; ter a intenção de comunicar um conteúdo proposicional verdadeiro, a fim de que falante e ouvinte possam compreender-se mutuamente; querer verdadeiramente exprimir as suas intenções, a fim de que o ouvinte possa acreditar nele; escolher um proferimento justo em relação às normas e valores vigentes, a fim de que o ouvinte possa aceitar o proferimento e ambos possam entrar em acordo em relação a um fundo normativo reconhecido.

A acção comunicativa só pode continuar enquanto os seus participantes pressupõem que essas pretensões recíprocas de validade sejam justas. A meta da compreensão é a produção de um consenso que culmina na unidade intersubjectiva do entendimento recíproco, do saber participado, da confiança mútua e do acordo recíproco. O consenso funda-se na base do reconhecimento das quatro pretensões de validade correspondentes: compreensibilidade, verdade, veracidade e justeza. Se o acordo pleno, que contém os quatro componentes, fosse o caso normal, então não seria necessário analisar o processo da compreensão sob o aspecto dinâmico da produção de consenso. A compreensão é exactamente o processo da produção de um consenso sob a base pressuposta de pretensões de validade, comummente reconhecidas. Se esse fundo normativo é posto em questão, então a acção comunicativa não pode continuar.

Este consenso de fundo implica que, pelo menos, falante e ouvinte saibam, implicitamente, que cada um deve levantar essas pretensões, para que possa ocorrer uma comunicação no sentido de uma acção orientada para o entendimento e assim pressuponham mutuamente que tais pretensões sejam justas e partilhem a convicção de que essas pretensões já foram legitimadas ou poderão sê-lo. Habermas distingue, pois, condições, pretensões e legitimação. A legitimação significa que o proponente, quer pelo apelo a experiências e intuições, quer pela argumentação, fundamenta a dignidade do reconhecimento e produz o reconhecimento intersubjectivo.

8. Referências Bibliográficas

  • Austin, J. L., Quando dizer é falar: Palavas e Acção. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
  • Esteban, R. G., El médico como persona en la relación médico-paciente. Madrid: Editoral Fundamentos, 2002.
  • Gracia, D., La empresa de viver: Estúdios sobre la vida y la obra de Pedro Laín Entralgo. Barcelona: Círculo de Lectores, 2003.
  • Laín Entralgo, P., Teoría y realidad del otro. Madrid: Alianza Editorial, 1988.
  • —, Introducción histórica al estúdio de la Patología Psicosomática. Madrid: Editorial Paz Montalvo, 1950.
  • —, «El momento afectivo de la relación médica». In: La relación médico-enfermo. Madrid: Editorial, 1983.
  • —, O que é o homem: Evolução e sentido da vida. Trad. do espanhol por Anselmo Borges; Daniel Serrão; João Maria André. Lisboa: Editorial Noticias, 2002.
  • —, Teoría y realidad del otro. Madrid: Alianza Editorial, 1988.
  • Habermas, J., Teoría de la Acción Comunicativa: Complementos y Estúdios Prévios, 3ª ed., Madrid: Ediciones Cátedra, 1997, p. 86.
  • —, Teoría de la Acción Comunicativa: Complementos y Estúdios Prévios, 3ª ed., tradução do alemão, Madrid: Ediciones Cátedra, 1997, p. 87.
  • —, Connaissance et Intérêt, Paris: Éditions Gallimard, 1976, p. 374.
  • —, Teorías de la Verdade, In: Idem, Teoría de la Acción Comunicativa: Complementos y Estúdios Prévios, 3ª ed., Madrid: Ediciones Cátedra, 1997, p. 87.
  • Orringer, N., La aventura de curar. La antropología médica de Pedro Laín Entralgo. Barcelona: Círculo de Lectores, 1997.

  1. Cf. Habermas, J., Um Perfil Filosófico e Político, In: Sader, Emir, Vozes do Século: Entrevistas da New Left Rewiew, Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1997, p. 128. ↩︎

  2. Cf. Habermas, J., O Horizonte da Modernidade está a Deslocar-se, In: Idem, Pensamento Pós-Metafísico: Estudos Filosóficos, Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1990, p. 15. ↩︎

  3. Cf. Austin, J. L., Quando Dizer é Fazer: Palavras e Acção, Porto Alegre: Artes Médicas, 1990, p. 29. ↩︎

  4. Cf. Habermas, J., Teoría de la Acción Comunicativa: Complementos y Estúdios Prévios, 3ª ed., Madrid: Ediciones Cátedra, 1997, p. 86. ↩︎

  5. Cf. Habermas, J., Teoría de la Acción Comunicativa: Complementos y Estúdios Prévios, 3ª ed., tradução do alemão, Madrid: Ediciones Cátedra, 1997, p. 87. ↩︎

  6. Laín Entralgo, Pedro, Teoría y realidad del otro. Madrid: Alianza Editorial, 1988, pp.281-282: «Gracias a nuestro amor es posible que tú y yo, siendo Laín y teniendo que ser dos en el orden de la existencia empírica, seamos uno en la trascendencia.» ↩︎

  7. Laín Entralgo, Pedro, Teoría y realidad del outro, pp.348-349: «El hombre es el ser de la expresión (…). El modo de darse el hombre, en su presencia fenoménica, lo revela ya primariamente como ser la expresión, es decir, como el prójimo. El otro es espontánea e inmediatamente aprehendido como prójimo por una acción de cualquier manera habrá de ser expresiva». ↩︎

  8. Laín Entralgo, Pedro, Teoría y realidad del outro, p. 228: «solo el silencio en presencia del tú, silencio de todos los lenguajes, espera muda en la palabra informulada, indiferenciada, preverbal, deja al tú un libertad, y permite esa equilibrada contención en que el espíritu, sin manifestarse, está presente.» ↩︎

  9. Laín Entralgo, Pedro, Introducción Histórica al estúdio de la Patología Psicosomática. Madrid: Editorial Paz Montalvo, 1950, pp.198-199 ↩︎

  10. Laín Entralgo, Pedro, Teoría y realidad del outro, p. 603: «La actividad interpersonal pretende pasar desde la expresión percíbida a la intención que en ésta se expresó, para convivirla coejecutiva y compasivamente. Quien se expresa, convierte lo interior en exterior; quien personalmente comprende al que se expresa, se remonta desde lo exterior a lo interior y descubre por experiencia propia, no sólo lo que significa objetivamente la expresión del otro, su “sentido objetivo”, sino también lo que esa expresión significa en la vida del hombre a que pertenece, su “sentido personal”». ↩︎

  11. Entende-se por relação objectivante, quando no encontro entre duas pessoas, uma das pessoas (ou até as duas) tenta converter o outro em puro objecto (o outro fica reduzido a uma “coisa”, realidade exterior, carente de liberdade pessoal e de finalidade própria). ↩︎

  12. No diálogo interpessoal, nasce uma relação de ajuda, uma relação inter-pessoal, em que as duas pessoas se consideram e se tratam como seres, a cuja realidade individual pertence a “vida”, a intimidade, a inteligência, a liberdade e a capacidade de apropriação. Um ser humano é uma pessoa, enquanto executa e realiza actos inteligentes, livres e próprios. ↩︎

  13. Ibidem, p.608. ↩︎

  14. Ibidem, p.663. ↩︎

  15. Laín Entralgo, Pedro, «El momento afectivo de la relación médica». In: La relación médico-enfermo. Madrid: Editorial, 1983. (466-479), p. 466. ↩︎

  16. Cf. Habermas, J., Connaissance et Intérêt, Paris: Éditions Gallimard, 1976, p. 374. ↩︎

  17. Ibidem, p.318. ↩︎

  18. Ibidem, p.323. ↩︎

  19. Ibidem, p.324: «Solo interpretándola, pronto veremos como, puede ser verdaderamente mi vida». ↩︎

  20. Laín Entralgo fundamenta a ideia de si mesmo, porque à realidade concreta da existência humana pertence, por modo necessário, a auto-visão e a auto-intelecção, portanto por meio de uma “ideia de si mesmo”, mais ou menos clara, penetrante e certeira». ↩︎

  21. Ibidem, p.329. ↩︎

  22. Ibidem, p.334. ↩︎

  23. Esteban, Rosa Gómez, El médico como persona en la relación médico-paciente. Madrid: Editoral Fundamentos, 2002, p.174. ↩︎

  24. Ibidem, p.53. ↩︎